sábado, 7 de abril de 2012

O Hamster, o Demo e o brinde

E mais uma vez o brasileiro acompanhou um antigo e suposto defensor da moral e ética na política ser trucidado por denúncias de corrupção. Dessa vez, o truculento Senador Demóstenes Torres foi apanhado no ato- gravações telefônicas feitas pela competente PF provaram suas relações promíscuas com bicheiros, contraventores e empresas de fachada. A maior surpresa se deu porque Demóstenes, relator do Projeto que criou a Lei complementar 135/10 ( a Lei da Ficha-Limpa), era apontado como um defensor da probidade política, muitas vezes radical em suas acusações contra políticos governistas. Comandou, mais de uma vez, campanhas pela renúncia de ministros acusados de corrupção e enfrentou colegas do Parlamento- como o senador José Sarney- em verdadeiras cruzadas pela "limpeza'' do Congresso Nacional. Tudo, é claro, manifestação de uma enorme hipocrisia. Seu radicalismo acabou por isolá-lo dentro do próprio partido (o DEM), que lavou as mãos diante do escândalo, expulsando Demóstenes da sigla. Sempre achei, pessoalmente, o hipócrita Senador muito semelhante a um Hamster, fisicamente. Que os representantes da classe animal me perdoem por semelhante ofensa.

Com as denúncias, nosso Hamster acabou preso numa gaiola de ferro. A mídia, capitaneada pela revista Veja, divulgou o escândalo e forneceu munição aos inimigos políticos de Torres para finalmente retirá-lo da jogada. Convenhamos, acelerar alguns projetos de lei em tramitação no Congresso não é nada perto de fraudar licitações, vender concessões de veículos de comunicação ou mesmo grilar terras, os três crimes mais comuns aos parlamentares. Mas foi o suficiente para destruir o Hamster raivoso e deixá-lo quietinho. 

                                                  Agripino Maia, um dos líderes do DEM

Já o partido, o Dem(o), só lamenta perder mais uma cadeira no Senado. Depois do escândalo protagonizado por José Roberto Arruda, o velho sustentáculo político da Ditadura militar não podia esperar por mais nada: para ser franco, o antigo PFL constitui um fóssil vivo da velha política característica do governo ditatorial. Os componentes do Dem formam círculos fechados, sustentados por grandes latifundiários, setores conservadores do clero católico e por alguns industriais, que, por terem atuado durante uma época onde não existia fiscalização da sociedade sobre seus atos, acostumaram-se a jamais prestar contas de seus atos e a agir sem ética alguma. 

O patrimônio público é também patrimônio do partido e de seus componentes, que o usa para maximizar os lucros de seus apoiadores da iniciativa privada. Basta que se recorde das mega-obras "públicas'' realizadas durante os anos 1970, altamente superfaturadas, faraônicas e muitas vezes ilegais, como a transamazônica, hidrelétricas e portos, onde uma parceria entre os políticos do ARENA (hoje, o Dem) e super-empreiteiras acabavam em quebras de licitação, autorizações para empréstimos externos (que resultaram na escalada da Dívida Externa e sua explosão na década de 80) e garantiam Emendas parlamentares ao Orçamento garantindo recursos para programas fraudulentos. Os principais beneficiados eram empreiteiras (que executavam os "projetos'', pagando comissões aos políticos para que estes "facilitassem'' os processos), indústrias estrangeiras e, claro, os Bancos internacionais, que financiavam as falcatruas feitas em nome da Coisa Pública. A partir desses métodos, José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá, entre outros homens-chave da política nacional, fizeram fortunas astronômicas e garantiram sua hegemonia política por muitos anos. A partir desses pilares- as relações promíscuas com o setor privado-, e fundamentando-se politicamente no agronegócio nascente, o ARENA institucionalizou o modus operandi da corrupção. Vale dizer que a pauta do Agronegócio- como a negação da Reforma agrária ou crédito para o pequeno agricultor bem como desvalorização do câmbio- dominou (e, ainda hoje, domina) o campo de atuação do Dem. 

Em suma, o ARENA, durante a ditadura, valendo-se da ausência de fiscalização, e tendo o respaldo dos militares (que realizavam o trabalho sujo de manter a repressão, a censura, o arrocho salarial e permitir subsídios astronômicos ao agronegócio), acabou tornando essas relações de dependência com as forças privadas obrigatórias para a manutenção de qualquer governo (vale dizer que os pefelês se tornaram as pontes entre o setor privado e os militares), construindo interesses, por parte da iniciativa privada, intocáveis, imexíveis, quase sagrados. Interesses que incluem vilipendiar a Coisa Pública, constituída pelos impostos, taxas e demais tributos pagos por todo o resto da sociedade. Ou seja, empreiteiras, indústrias, bancos e o poder político (dominado, durante mais de 38 anos, pelo ARENA/PFL) elaboraram um monstruoso mecanismo de extração de renda, que acumulou as riquezas produzidas pelo esforço coletivo no topo da pirâmide social brasileira. O resultado foi desastroso: fome, explosão da violência, do desemprego, da hiperinflação, a bagunça institucional generalizada, a dissolução da democracia, todos os problemas que ainda hoje vivemos. O auge do domínio deu-se durante a ditadura, mas o PFL constituía sustentáculo dos governos Sarney e, posteriormente, Fernando Henrique Cardoso, possuindo mais de 100 deputados em sua bancada na Câmara dos deputados, eleitos pela força do Agronegócio, sua base eleitoral. 

Derrotados em 2002 pela coalizão nacionalista comandada pelo PT, o PFL deixou o poder, mas as ervas daninhas plantadas no coração de poder político- Brasília- permaneceram. Empreiteiras continuaram a quebrar licitações em parceria com políticos, programas e planos permaneceram sendo fraudados e o agronegócio continuou a receber seus mimos. A política continuou  a mesma, ainda mais nos estados onde tradicionalmente o PFL dominou, como no Rio Grande do Norte e, vale dizer, na pérola da coroa dos Demos, Santa Catarina, o estado onde impera o maravilhoso reino do agronegócio. A nova geração substituiu, aos poucos, os velhos caciques e carcarás da velha direita, sem alterar os métodos antiquados, típicos dos corruptos que possuem férrea certeza em sua impunidade. Nessa categoria, incluí-se nosso infeliz Hamster, que, agindo contra as práticas usuais do próprio partido, acabou descartado: Torres fechava fileiras contra o fisiologismo criado pelo próprio partido, desenvolvido pelo PMDB e consagrado como único meio de fazer política nos altos círculos do poder.

Expulso o inconveniente Hamster, os líderes atuais do Demo, o Senador Agripino Maia e o Deputado ACM Neto comemoram, com muito champagne importado e pago com as comissões que recebem de seus amigos latifundiários, a retomada total do velho espírito Arenista. Não porque Demóstenes representasse ameaça ao velho PFL, mas porque, aparentando ser defensor da ética, acabava por esconder suas relações promíscuas com criminosos dos próprios aliados. Ou seja, o disfarce da ética servia mesmo de imunizante contra seus antigos aliados que, um após o outro, estão caindo devido as seguidas denúncias de corrupção, desde a queda do partido, em 2002; nosso Hamster, então, fugiu das trapaças demoníacas e tratou de se blindar contra elas, atacando os corruptos de outras siglas (principalmente PT e PMDB). Porém, ao tentar isolar-se para não contaminar-se com a sujeira grossa dos colegas de sigla e salvar-se do barco furado, o Hamster acabou se complicando mais- já que, como seus pares, não passava de um corrupto, embora o escondesse melhor que ACM e sua trupe. Além de corrupto, não teve coragem de embarcar na mesma canoa furada que seus velhos amigos- eu, pessoalmente, não ficaria nada satisfeito com isso, se fosse membro do Dem. Sem apoio destes, Demóstenes caiu. Ou vai cair, é questão de tempo.

E assim, com o brinde dos ex-(nem tanto assim)aliados do prodigioso Hamster, terminamos este post. E brindamos também, porque, pouco a pouco, essa velha raça de corruptos e reacionários - o antigo ARENA- vai sendo extirpada da política. É uma pena que os novos agrupamentos políticos ocupam o lugar dos velhos carcarás. Mas depende de você e de mim mudar isso. Conhecer o sistema nem tão oculto assim pelo qual o poder político opera realmente (muito longe do formalismo imposto pelos protocolos oficiais) é vital para mudá-lo. Brindemos também, mas pela esperança de um Brasil melhor. E sem Hamsters.


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