quinta-feira, 13 de julho de 2023

A alegria do ser visto

 A trôpegos passos de insone

Me conduzo à procura do teu ícone

E espero pela tua entrada

Ante as comensais isoladas

 

Eu te verei?”, sofro

Enquanto aos céus oro

Para que te deixes contemplar

 

Dar-se a ver ou ser visto?

Que mais vale a um coração?

Pois um olhar teu, em lampejo

Incendeia o meu ensejo

 

O ser visto vai além

De toda a forma fica sem

Não mais um ser; mas "o" ser da paixão

 

Contemplar ou contemplado ser?

Não duvido, pois, sem pensar

Te digo que o êxtase de contemplar

Supera o dar-se a ver

 

E rogo todos os dias para que o meu ser visto sempre se desvele.

Cascata negra

 As rosas passam pela vista

Um pouco discretas

Belas, mas somente belas

Só que uma sempre merece uma vela

 

Que de especial tens

Para merecer um ponto luminoso?

Dentre mil, és tu que me vens

E te sentas em trono glamuroso

 

Meus pensamentos, sequestras

Minha vontade, domas

Meu querer, tomas

E de mim te fazes mestra

 

Com a coroa enfeitas

A cascata negra que te desce abaixo

Tranquila, como rio reto abaixo

Em cuja luz reluz perfeita

 

A luz que me deita um olhar

Sob um mar de cabeças preocupadas

Apagou todas as rosas ali deixadas

E só vi tua alegria a transbordar

 

Bela rosa, única felicidade

Tu transbordas em teu nome

Mil vezes bela, a de mil odes

 

Em cujas corredeiras negras se perdem aqueles que amam as rosas

Ou apenas uma.

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

A TRAGÉDIA DE UM (MUITOS) GARANHUENSE(S)

Fui fazer a feira na CEAGA - tava em obra
Passei mal e fui no Posto - não tinha médico e remédio
Voltei do Dom Moura e paguei passagem mais cara
E o ônibus - como demorou!

Ninguém quer assinar minha carteira
Faço um bico vendendo água ou salgado
Peguei uma moto pra fazer um extra
A cada metro tem um quebra mola e um cabra pra multar!

Não tem onde deixar o menino
creche aqui, só pagando
E ainda tem o remédio de mainha
não, não tem no Posto!

Oh Senhor, tropecei voltando da Farmácia
esse calçamento derreteu na trovoada
a praça é bonita, mas cadê a o sorriso do povo?

e aí encontrei o primo Zé lá do sítio
até fome passou
os bicho tudo morreu
Cadê os doutor de terno nessa hora?

Não tem dinheiro, não tem assistência
botaram na net que mandaram um trator pro Zé
Aí o Zé foi embora
porque mentira não enche barriga

Zé e eu fomos pra Caruaru
Petrolina
Recife
São Paulo
O coração dói, mas a barriga ronca

A saudade é grande, Garanhuns
mas enquanto essa gente mandar, eu e Zé vamos viver pelo mundo
junto com muitos mais que estão por vir
de quatro em quatro anos, foi-se nossa vida

Acorda, Garanhuns, porque quem tem que ir embora da cidade é esse povo que manda na Prefeitura!


segunda-feira, 5 de outubro de 2020

As eleições em Garanhuns: terá fim a noite de 24 anos?

 Sob as nuvens da pior pandemia do século, candidatos e candidatas começaram, depois de dois anos, a percorrer as ruas da saudosa Garanhuns. Brigando ombro a ombro pela dignidade de comandar a 9ª maior cidade de Pernambuco, três pretendentes se apresentam com mais força - e refletem muito do desânimo que assola a política nacional como um todo.

Afinal, os quase 150 mil mortos brasileiros - e, destes, pelo menos 80 só em Garanhuns - juntamente à crise econômica não deixam muito ânimo para que os cidadãos pensem em política. Todas as campanhas estão mirradas, num efeito nacional. Pouco se fala, nos noticiários e nas ruas, sobre os candidatos.

Mas, não fosse este o clima nacional, bem o poderia ser em Garanhuns. Ora, dentre os pretendentes melhor posicionados na corrida para a prefeitura, nenhum nome é novo ou desperta muito entusiasmo; na verdade, é uma eleição muito ditada pela velha política.

E não se trata de um trocadilho a um candidato específico. Trocando em miúdos, há 24 (vinte e quatro) anos a cidade está sob domínio de um mesmo grupo político e está prestes a iniciar um novo ciclo em sua história. Essa situação gera cansaço e despolitização.

Mas, em que pese tal desânimo, nunca foi tão importante pensar bem em quem deve governar Garanhuns. A maior crise econômica em 100 (cem) anos está às nossas portas e nunca antes na história as prefeituras serão tão necessárias para reparar, atenuar ou combater as inevitáveis mazelas sociais que surgiram, surgem e surgirão por conta da crise que o país atravessa. 

É por isso que começamos com os problemas. Garanhuns, há muito, sofre com desemprego alto, sendo que as vagas que existem não exigem muita qualificação profissional - o que gera salários baixos e pobreza, com grande parte da força de trabalhos sobrevivendo informalmente, através de "bicos''. A economia local é pouco diversificada, dependente ao extremo do comércio e dos serviços, bem como do mercado consumidor das cidades vizinhas.

 O maior problema social, fora o desemprego e a inércia econômica, com certeza é o acesso à saúde: a cidade é a única de seu porte (e a única do Agreste, ao lado de Jurema) que não possui Hospital Municipal (fechado pela atual gestão) e nem fornece a seus cidadãos algum centro de diagnósticos; os postos de saúde não tem médicos ou remédios, o que gera uma super demanda ao Hospital Estadual Dom Moura muito conhecida para funcionários e pacientes; sequer possui uma casa de passagem e acolhida para os garanhuenses que precisam se deslocar à capital. Vários postos de saúde abandonados, em que pese construídos pela atual gestão, criam mato, se deterioram e são utilizados para acobertar crimes. E que nem se fale na UPA: esta, uma vez pronta, foi, tal como os postos de saúde, literalmente abandonada e, às pressas, reativada na pandemia, numa "reforma'' (quem já viu reformar o que acabou de ser construído?) polêmica e que pouco agregou à cidade.

Outro problema jamais atacado nessas quase três décadas é o declínio irreparável da zona rural. A começar por um redimensionamento da área do município efetuado pelo IBGE (que tirou de Garanhuns muitas terras rurais e as passou para Caetés e Paranatama), os agricultores e produtores enfrentaram quase uma década de seca (2011-2017) sem apoio algum da Prefeitura. A produção de leite é praticamente a mesma que há dez anos, e até menor; as culturas de feijão, macaxeira e milho, vitais para alimentação do povo nas feiras populares, estão decaindo há cerca de cinco anos. Os feirantes não tem apoio do governo municipal, que, quando agiu, o fez para prejudicar os produtores, como quando impôs uma empresa para organizar as feiras populares da cidade, voltando atrás diante dos altos custos a serem suportados pelos feirantes e denúncias de maracutaias envolvendo a dita empresa - que, sediada em Caruaru, se provou ser uma "empresa-fantasma''. Até mesmo a CEAGA - a central de abastecimento da cidade - está há anos em reforma e não foi entregue, gerando prejuízos incalculáveis para feirantes e populares.



Na educação, Garanhuns possui um avançado polo de ensino superior pouco inserido na economia local, ao contrário de outras cidades, que tem programas de estágios e estímulos para os estudantes ficarem e produzirem na cidade após concluídos os estudos, nela empregando o que aprenderam em instituições renomadas como a UPE e a Universidade Federal do Agreste. A escola técnica municipal foi fechada, aliás, e as mães e pais que trabalham não tem creches para deixarem os filhos - até foram construídas, mas hoje juntam mato e servem de ponto de distribuição de drogas. Outras escolas, como a Padre Agobar Valença, nunca terminaram suas obras. 

Todos esses problemas, por incrível que se pareça, foram reconhecidos pelos principais candidatos a prefeito em seus planos de governo. Todos disseram que irão reabrir o Hospital Municipal, construir mais postos de saúde, inserir as universidades na economia local, atrair investimentos privados através de estímulos fiscais, inaugurar creches e "dar apoio'' ao agricultor. Desnecessário dizer que, também, consentem em expandir a programação turística da cidade, seja transformando Garanhuns na "terra dos festivais'', dando 30 dias ao Festival de Inverno ou ressuscitando o Festival de Jazz - este, perdido para Gravatá na última gestão. 

As propostas, assim, são boas e partem de um diagnóstico parcialmente correto do que a cidade precisa. Mas aí, entra a realidade: vocês acham mesmo que a cidade, que, segundo o atual gestor, estaria "quebrada'', tem mesmo condições de levar a cabo tantas e tão custosas obras e ações?

Veja-se que um dos candidatos, aquele que diz ser doutor, quer dar uma bolsa para jovens estudantes terem "o primeiro emprego'' nas empresas da cidade, copiando o programa Jovem Aprendiz às custas do erário. Aí eu me pergunto: onde um jovem agrônomo irá trabalhar em Garanhuns? De onde vai sair o dinheiro para pagar, digamos, 200 bolsas de cerca de R$ 1.000,00 (um valor médio de uma bolsa de estágio) no atual cenário de penúria?

Ora, se trata, evidentemente, daquele tipo de proposta destinada a jamais ver a luz do dia. Outra, pouco desenhada na prática, e repetida por todos os candidatos, é "dar estímulos fiscais'' para que as empresas se fixem em Garanhuns. Meus amigos, como a cidade pode se dar ao luxo de perder receita - porque dar estímulo fiscal é exatamente isso: diminuir os impostos e contribuições para que determinado setor da economia se instale - na atual situação, quando ela gasta mais que arrecada, junto com o resto do país?


Tem candidato até mesmo prometendo aumentar o número de cursos da AESGA, também sem dizer de onde vai sair a grana. Outro, aquele mesmo que diz ser doutor, quer terminar as obras do atual governo, de quem é continuador. Se não conseguiram terminar as obras quando a cidade nadava em dinheiro, como irão terminar agora, quando a fonte secou?

A pior desfaçatez fica mesmo com as propostas para o setor rural. Ajeitar estradas e distribuir sementes é tudo o que dois dos candidatos propõem, aliado à coisas genéricas e sem sentido. Apenas um propõe levar os estudantes da Universidade Rural ao campo e criar um programa de estímulo à agricultura familiar com base em estudos científicos e fortalecendo a auto organização dos produtores, incentivando as cooperativas; aliás, uma proposta de baixo custo para o erário público, mas de enorme repercussão econômica. 

As demais propostas nem merecem comentários. O custo milionário para construir um Hospital Municipal, Postos de saúde e creches simplesmente são, hoje, irrealizáveis: Garanhuns é, como a maioria das cidades nordestinas, uma terra falida, que depende da boa vontade do Governo Federal, gastando mais do que arrecada. 

Então, meus amigos, não adianta distribuir bolos com recheio de ar. Apesar de partirem de uma boa leitura das necessidades de Garanhuns, os candidatos rivalizam em populismo; cada um com um plano de governo mais inexequível que o outro. 

Mas o que mais chama a atenção em tudo isso é que o próprio candidato do prefeito é o que tem, talvez, o programa de governo mais extenso. Aliás, o Plano de governo do "doutor Silvino'' é quase uma negação do que foi o governo Izaías Régis: promete reabrir o Hospital que o padrinho fechou, jura terminar os postos de saúde que ele nunca inaugurou, diz que vai estimular empregos e dar a tal bolsa aos jovens que o governo Régis (podendo fazê-lo) jamais o fez, bate na mesa que vai dar estímulos para as empresas virem para Garanhuns (coisa que a gestão atual deixou para lá) e até mesmo se prontifica a trazer de volta o Programa "Prefeitura presente'', da gestão Luiz Carlos, onde a prefeitura fazia ações sociais nas periferias, distribuía cestas básicas, realizava mutirões e estimulava atividades culturais, como levar crianças pobres ao cinema e ao teatro. 

A conclusão maior é de que o plano de governo e as promessas do tal doutor são quase uma confissão de culpa pelo que ele mesmo, quando foi prefeito (1996-2004), seu sucessor indicado Luiz Carlos (2004-2012) e seu aliado de sempre e hoje padrinho eleitoral Izaías Régis (2012-2020) simplesmente não fizeram: assegurar uma Saúde digna aos garanhuenses, ao menos na realização de consultas e exames eletivos e, principalmente, oportunidades de emprego e desenvolvimento econômico.

Dessa forma, é muito difícil que, depois de 24 anos, os mesmos sujeitos de sempre cumpram o que prometeram. E tudo isso pode ser dito sem se olhar para o vasto histórico criminal do candidato do PTB (Silvino, o doutor), que se livrou de várias denúncias e processos pelo fato de ter mais de 70 anos (aos amigos leigos nas letras jurídicas, ao se atingir tal idade, os prazos para que um sujeito seja processado por crimes cai pela metade. Como a maioria dos processos de Silvino era antiga, quase todos prescreveram, sendo arquivados sem jamais se apurar a culpa dele, embora o Tribunal de Contas do Estado tenha rejeitado duas prestações de contas suas - 2003 e 2004 - e o mantido inelegível por anos). 

Silvino Duarte, o nome que sempre utilizou nas urnas (e talvez o "doutor'' Silvino seja para iludir a população de que se trata de outro Silvino que não aquele que sumiu em 2004), não é apenas o candidato do atraso: é o candidato da conformidade. Com ele, aqueles que buscam de forma desesperada dilatar o hoje, sufocando o amanhã, tentam uma última chance de manter suas benesses e vantagens sem entender que um dia não pode durar 24 anos. 

Isso porque a vitória de Silvino, dando continuidade à atual forma de governar a cidade (calçar ruas em época de campanha, enfeitar a cidade com piscas-piscas, patrocinar farras para o povo e manter uma extensa camarilha de funcionários/militantes comissionados), no atual cenário de crise do país será a morte definitiva da cidade. Ou Garanhuns se reinventa e aposta no desenvolvimento, na atração de indústrias e grandes produtores para se instalarem no município e utiliza a economia potencial criativa oriunda dos centros educacionais aí sediados, ou será engolida por uma crise econômica terrível que levará décadas para ser superada. O povo tem alguma noção disso e daí existir mais intenção de votos aos adversários de Silvino do que ao bom doutor.

Silvino, assim, é o mais rejeitado dos candidatos e, na soma dos adversários, perde nas pesquisas. Isso mostra que, na reta final, os eleitores que não o querem de jeito nenhum vão migrar para o oposicionista mais forte e garantir sua vitória - assim espero. 

Se o amanhã vai chegar ou o triste dia em que a era Silvino começou em Garanhuns vai se perpetuar por mais 4 anos, só o bom senso da população irá dizer. É por isso que este post começa com a imagem que representa muito bem a Garanhuns do último quarto de século: a placa desbotada do Shopping jamais construído, a representação de que, na Terra de Simoa, o desenvolvimento nunca passou de promessa eleitoral. 

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

O Orçamento impositivo é uma farsa: ou de como um TCC pode prever o futuro!


Corria o ano de 2015 – o início da crise política, econômica e social que vivemos até hoje. Então concluindo o curso de direito, sob orientação do mestre Cláudio César de Andrade, e diante das opções de elaborar uma monografia sobre temas batidos, resolvi investigar algo realmente relevante.
Naquela época, o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, mantinha uma guerra aberta com a presidente Dilma Rousseff. Uma de suas principais munições contra a titular do Executivo foi tornar as emendas parlamentares ao orçamento “impositivas’’ – para quem não se recorda, o orçamento público federal, ao ser enviado pelo presidente da República ao Congresso para ser debatido e aprovado, pode ser alterado pelos parlamentes. Suas excelências sempre dispuseram de alguns nacos milionários para destinar a seus redutos eleitorais. Acontece que apenas o presidente da República liberava, se e quando desejasse, esses valores. Isso muitas vezes acontecia após o parlamentar votar de acordo com os interesses presidenciais.
O que era ruim se tornou ainda pior. A partir das mudanças patrocinadas pelo ilustre deputado Cunha, o presidente se veria obrigado a executar – a gastar, em suma – o valor que os parlamentares desejassem. Esse valor se limitava a 1,2% da receita líquida do governo, na época coisa de 10 bilhões de reais. Cada parlamentar poderia dispor de algumas dezenas de milhões para fazer o que desejar.
Nas conclusões da minha monografia, sustentei, além da evidente inconstitucionalidade de tal alteração constitucional, que os parlamentares não tinham qualificação técnica nem elaborariam estudos sobre a melhor forma de aplicar o dinheiro de tais emendas. Basicamente, o dinheiro serviria para a promoção pessoal, populista e eleitoreira dos próprios deputados e senadores, acarretando grande risco de desperdício de recursos públicos:

“É de se considerar que, no momento em que as emendas de despesa passam a ter execução obrigatória, os parlamentares passam a agir como administradores de recursos públicos, sendo os formulares até mesmo de programas de governo e obras públicas nas suas regiões de interesse eleitoral. A grande problemática desse fato é que não há uma garantia sólida de como a decisão política tomada pelo parlamentar, no momento em que destina uma emenda de despesa a seu município ou Estado de origem, é tomada: ora, qual o critério para se destinar a emenda para o ministério da saúde e não para o da educação? Por que se devia construir um posto de saúde no bairro A e não no município B, ainda mais carente? O real beneficiado pela execução da emenda parlamentar é mesmo o cidadão? O interesse público é atendido? Todas essas deficiências põem em cheque a capacidade dos parlamentares de 1) identificar, com precisão, quais as necessidades coletivas que devem ser satisfeitas pelo Estado; 2) formular, com base em tal seleção, uma política pública eficaz para guiar a formulação da despesa pública; 3) estruturar e planejar o gasto público, com base em estudos técnicos, de forma a atender à necessidade escolhida.’’ (GUIMARÃES, Jorge. “O Orçamento impositivo’’: Um novo capítulo na crise da Separação dos três poderes à luz da Emenda Constitucional nº 86/2015)

Por tais motivos, não foi surpreendente ler hoje que “TCU aponta baixa eficácia na aplicação de emendas parlamentares’’(in: https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/politica/2019/12/714830-tcu-aponta-baixa-eficacia-na-aplicacao-de-emendas-parlamentares.html) , especialmente o seguinte:

“Recursos destinados por deputados e senadores para financiar obras e programas nas suas bases eleitorais não contribuem para melhorar a vida das pessoas. Na hora em que se decide para onde parte das emendas parlamentares deve ser enviada, necessidades reais da população são ignoradas. Estas são algumas das conclusões de uma auditoria em emendas feitas entre 2014 e 2017 que o Tribunal de Contas da União (TCU) acaba de concluir.
Todos os anos, parlamentares podem decidir onde o governo deve colocar parte dos recursos públicos. Ao todo, cada um tem o direito de apresentar até 25 emendas individuais. O valor muda ano a ano. Em 2020, serão R$ 15,9 milhões por parlamentar, o que significa que o destino de R$ 9,5 bilhões será decidido pelos 513 deputados e 81 senadores do Congresso.’’

A coisa ficou pior do que o previsto. Deputados e senadores destinaram recursos públicos para obras fraudulentas; shows e festividades milionárias; compras viciadas e desnecessárias. Se tornou comum as notícias, em blogs e sites de notícias regionais e locais, que o “deputado fulano destina n milhões para a saúde de tal lugar’’.
Foram exatamente tais situações que me levaram a considerar a EC 86/2015, que criou a nefasta figura do orçamento impositivo parlamentar, não apenas inconstitucional, mas um sintoma de crise política e, ela própria, uma perversão da democracia:

“Diante da prevalência das emendas parlamentares como instrumento de poder tanto nas mãos do presidencialismo forte quanto numa crescente oligarquização dos partidos políticos presentes no interior do Congresso Nacional, acrescido da baixa representatividade das forças políticas no interior do Legislativo, não se vê necessidade técnico-jurídica para a manutenção das emendas parlamentares ao Orçamento. Estas, na verdade, constituem unicamente um mecanismo de barganha política e fermento do personalismo político, transformando o legislador em gestor público, algo que, a rigor, contraria a própria função de legislar e invade o campo de atuação do Executivo.
O orçamento impositivo das emendas parlamentares, assim, vem com ideia oposta a que se propagandeia. Confere independência não ao poder Legislativo, mas aos próprios parlamentares para continuar a dispor de recursos públicos segundo seus interesses; confunde legislador e gestor numa figura híbrida que não deixa de confessar sua parentela com antigas práticas oligárquicas ainda reinantes no cenário político nacional; e, por pior, impede que recursos públicos essenciais sejam alocados para onde realmente devem, visto ser o parlamentar um ente quase descolado de seus representados devido às vicissitudes do sistema eleitoral vigente.’’

É triste notar como a realidade deixou tais previsões mais amargas. As emendas ao orçamento se tornaram um instrumento de oligarquização e “coronelização’’ da política brasileira que, além de tudo, transformou o modelo da Separação de Poderes de um sistema ocasionalmente em crise para um sistema permanentemente em crise. O desperdício de recursos públicos em plena grave crise econômica e fiscal, em um cenário onde a população hostiliza e não reconhece seus próprios representantes legais, denuncia não apenas o modelo de competências do Estado nacional afundou, mas, sobretudo, faliu.
Essa constatação parte da visão de que o Estado brasileiro se tornou desfuncional por completo. Em resumo: legislador governa; presidente não governa e legisla; Judiciário legisla e governa... e assim o projeto iluminista encontrou seu fim em terra brasilis


quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

O olhar que se foi


"Aquele olhar que me deste
O olhar de um sopro que afaga as chamas
Duas pequenas gotas castanhas
Perdidas na imensidão da noite

Quem sou eu, um conquistador?
Para manter cativos tais olhares
Eles, que despertam tantos amores
Já que da extrema beleza ninguém se faz senhor

Suave, te fostes embora
Sangrando, meu peito dói
Queimando, de saudade chora
Do olhar que se foi.’’

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Em busca da tua luz


’’As linhas do horizonte
Ficam mínimas ao ponte
Até a luz minha deixar o mundo
E somente me acompanhar no sonho

Por um dia ou um ano inteiro
Dura o anoitecer profundo
quando te escondes na tua caverna litoreira
quando teus passos distam do meu mundo

me ponho a te perseguir em frágeis caravelas
em um sonho de frenesi por tuas curvas belas
a proa a vencer as ondas, monstros e tempestades
e, enquanto as tormentas morrem, o amor arde

Pois, após o cabo das tormentas
Escondida no seio da terra bruta
Fecunda roseira reluz encoberta
Espera o bravo cansado

É que, se a deusa do sol escondeu-se distante
Por trás do manto negro de estrelas
Sob correias de arruda bela
Hei de vencer a escuridão para deitar ao teu colo celeste.’’