segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O teatro das calamidades: o dia em que o STF ajoelhou


Não é por eu ser proto-petista que lamento o resultado do julgamento da AP 470 até agora. Simplesmente os supostos fatos que embasam o ímpeto vingativo dos senhores ministros, oportunamente lançados ao estrelato midiático, não correspondem aos crimes a eles cominados! 

A questão central do processo (que deveria, como o "mensalão'' tucano, ter sido desmembrado...) gira em torno do contrato entre o Banco do Brasil e a Visanet, hoje Cielo, que supostamente desviou R$ 73 milhões, já que o contrato de publicidade entre o BB e a DNA, de Valério, teria sido uma ficção, e os recursos teriam sido ilegalmente repassados, via bonificação de volume, do BB para as empresas de Valério. Esse suposto desvio teria sido lavado nos bancos mineiros e repassados ao PT sob a forma de empréstimos fictícios. Mas, hora... a DNA prestou os serviços de publicidade ao BB. A bonificação de volume é praticada em larga escala há décadas pelas empresas de comunicação, e sua posse é da agência de comunicação, não do anunciante! Esse dinheiro não foi desviado... e simplesmente não há ligação entre esses recursos e os empréstimos "fictícios'' ao PT! Ora, é um tremendo negócio para um banco privado, como o Rural e o BMG, emprestar, mesmo sem garantia,quantias ao partido que exerce o comando do Governo Federal. Esses empréstimos realmente foram concedidos contra as normas internas do banco e sem garantias, mas não houve lavagem de dinheiro (e sim evasão de divisas, somente!), e usados para pagar dívidas pretéritas de campanha dos aliados do PT. NUNCA HOUVE UMA PROPINA MENSAL AOS PARLAMENTARES DA BASE DO GOVERNO! A acusação, diante disso, reuniu vários fatos difusos desconexos e, literalmente, "inventou, fabulou'' uma lógica e ligação entre eles. O fato de João Paulo Lima ter contratado a DNA de Valério para realizar um serviço de publicidade (94% terceirizado, como ocorre usualmente no setor) liga-se em quê a Dirceu e à suposta compra de votos na Câmara?

O apoio político do governo federal sempre foi comprado, de fato, mas com a distribuição de cargos e emendas ao orçamento. O objetivo político de certos setores da sociedade brasileira é tentar macular um governo que entrou para a história por ter revertido as políticas neoliberalóides vigentes, reformando o Estado e apostando no bem-estar social e na distribuição de renda. Um governo que beneficiou negros e pobres, que retirou 40 milhões de pessoas da pobreza e que reduziu a desigualdade social ao menor nível desde o governo JK e que, tendo esmagado as velhas forças das elites que dominam esse país, está tendo sua memória histórica atacada violentamente por agentes políticos muito mais sujos. Tenho inúmeras críticas contra o PT, mas negar seu papel histórico na formação do Brasil soberano, livre e igualitário, reduzindo-o a uma mera quadrilha, é ridículo, lastimável. Vergonhoso se mostrou o voto do excelentíssimo ministro Marco Aurélio, muito mais um panfleto político de mau-gosto, regado a surtos de bacharelismo provinciano, cujo objetivo foi atacar pessoalmente o ex-presidente Lula e o maior partido do Brasil em número de filiados. ME MOSTREM um documento, um único ato probatório que comprove ter existido uma quadrilha comandada por Dirceu e Genoíno! Não havendo, o que os doutos ministros  fizeram? Disseram que para se configurar corrupção ativa não se necessita de um ato de ofício... então o princípio secular do in dubio pro reu se inverteu e agora é um in dubio LASCA REU? Onde está a posição "garantista'' do STF, tão consolidada pela prática jurisprudencial? Parabéns ao ministro Ricardo Lewandowski pela sua coerência e firmeza de posicionamento, não se dobrando ao apelo sanguinário de uma mídia medíocre, manipuladora, criminosa.

Veja a que ponto os fortes interesses políticos da mídia e sua colossal influência pode levar. Isso tudo, é claro, com o objetivo não de servir e informar a sociedade, perseguindo seus interesses (e a justiça é um deles), mas de pressionar o governo federal com o fim de obter mais verbas publicitárias. O governo FHC tinha amplo apoio da mídia porque nenhuma outra administração investiu tanto em propaganda, beneficiando e muitas vezes sustentando veículos de comunicação como a Revista Veja e a Rede Globo.

Por fim, considero que a subserviência da mais alta corte de justiça brasileira aos sabores da opinião pública é desastroso para o país. Pior ainda é a evidente intenção de seus ministros de projetar suas imagens pessoais a partir do escândalo hipotético, com os mais variados fins (aumentar a capacidade de pressão política do Judiciário sobre o Executivo, com o fim de perseguir reajustes salariais maiores ou mesmo mais margem de manobra para decisões judicias cada vez mais anti-democráticas, como a que declarou constitucional e permissível a união dentre casais do mesmo sexo).

Este é um dia de luto para o país: a Corte Suprema do país beijou a cruz das pressões políticas e engavetou de vez sua missão de guarda da Constituição, para se tornar mais um órgão público a ser maculado pela prática do tráfico de influências políticas, através do velho jogo de pressões e troca de favores (que dá-se entre entre STF e mídia). "Dá-me a condenação dos petistas, que eu dou-te fama, glória e publicidade, que, nesse país, são o próprio poder...''

domingo, 21 de outubro de 2012

Despotismo nada esclarecido em Capoeiras: caótico descaso



A missão deste Blog é exercer um combate sistemático contra a pós-modernidade e seus desvalores. Nessa ampla atribuição, está a reflexão sobre a prática política brasileira, marcada pelo personalismo, clientelismo, patrimonialismo e outras graves epidemias seculares. Nestes tempos de ressaca pós-eleitoral, o brilho ideológico da campanha se devanesce como cortina de fumaça e só restam aos iludidos eleitores continuar suas vidas, que se resumem a trabalhar, arduamente, para sustentar tanto uma elite política corrupta, quanto seus corruptores, grandes empresários, latifundiários e banqueiros.



Recebi informações de um grande amigo, que é  militante nos grupos de esquerda da cidade de Capoeiras, urbe vizinha a Garanhuns, sobre a situação lastimável na qual se encontra o município, após a eleições. A atual administração, derrotada, está promovendo uma espécie de "política de terra arrasada'', cortando, injustificadamente, serviços públicos de primeira ordem, como o transporte de ônibus dos estudantes (para Garanhuns e Arcoverde), fechando postos de saúde e casas de apoio, demitindo médicos, motoristas, liquidando com o CRAES, chegando ao cúmulo de cancelar a viagem dos pacientes com câncer ao Recife. Diante disso, resta inferir algumas premissas: ou as contas públicas da prefeitura estão em péssimo estado (o que justificaria os cortes nos gastos), ou se trata de uma retaliação, da parte do Executivo, contra os servidores públicos e contratados que, supostamente, não apoiaram o atual prefeito em sua empreitada eleitoral em busca da reeleição. Ainda há a possibilidade de que se trate de tudo isso, acrescido de um possível uso indevido dos recursos da prefeitura para viabilizar a candidatura do atual gestor, o que seria o real motivo do desajuste fiscal do município- trata-se de abuso de poder econômico, tese corroborada pelas seguidas denúncias de compra de votos por parte dos correligionários do PR. Há informações de que recursos orçamentários existem, mas, misteriosamente, não estão sendo empregados.

Diante disso, que se registre a curiosa inércia do Ministério Público em defender os interesses públicos positivados na Lei, da qual foi investido como guardião.

Sendo assim, fica o alerta para os habitantes dos municípios do agreste meridional:  a simples derrota ou fim de mandato de um gestor que não irá continuar no cargo não justifica a paralisia dos serviços públicos, impostos ao município pela Constituição da República e pelas respectivas Leis Orgânicas; não são eles generosidades dos prefeitos ou dos políticos em geral, mas deveres impostos. Educação, Saúde e Transporte são direitos do cidadão, e não podem ser deixados ao arbítrio dos sentimentos pessoais de um governante - afinal, muito sangue foi derramado para que o interesse público fosse separado do privado e que não mais os reis, somente o povo, exercesse o governo da Coisa Pública. Essas pequenas práticas políticas como as descritas aqui, neste despretencioso artigo, tem de ser exterminadas com a vacina da cidadania. Somente ela poderá quebrar essas pequenas ilhas de despotismo que ainda insistem em sobreviver no Agreste Meridional. 

Enfim, a atual administração de Capoeiras deve lembrar que sua gestão termina apenas dia 31 de dezembro, ainda devendo exercer mais de dois meses de governança: caberá ao grupo político que está para sair do poder escolher se quer encerrar o mandato do PR de maneira dramática, sendo recordados como o governo do ressentimento, do descaso e do caos dos serviços públicos (estratégia pela qual esperam atrapalhar, ao máximo, o início do próximo governo, criando, desde já, obstáculos tremendos na forma da desestruturação dos serviços públicos, que precisariam ser reorganizados), ou se recuperarão a honra e, serenamente, entregarão a Administração municipal em bom estado aos sucessores.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Em busca da imortalidade


Um dos aspectos mais salientes do caráter humano é, antes de tudo, sua ciência da morte. Alguns antropólogos chegam a atribuir esse pequeno saber a posição de elemento central no conceito de "humanidade'', já que é pelo temor da morte que o ser humano organiza-se em sociedade, buscando prolongar sua vida graças ao esforço e proteção da coletividade. Essa eterna fuga da morte seria a "razão de ser'' das nossas sociedades, como as conhecemos. 

Contudo, a questão da morte vai mais além. Em quase todas as culturas conhecidas, a morte foi vista como um inimigo a ser derrotado pela religião, e esta, para isso, oferecia a vida eterna aqueles que seguissem determinadas condutas morais. Mais que uma estratégia para a consecução da estabilidade social e do controle de comportamento dos indivíduos- pelo temor da punição da morte-  essa busca pela vitória sobre a morte assumiu os ares da maior empreitada já levada a cabo pela humanidade. Eis o mito da possibilidade de consecução da imortalidade, um dos maiores fundamentos da civilização. Toda a ciência, avanços sociais, elaborações teológicas e demais esforços intelectuais do homem visam, em última instância, garantir uma espécie de imortalidade ao homem, ou então prometê-la. Mas a  imortalidade, tão cantada e desejada por milhões de seres humanos, não veio como se esperava e os políticos, filósofos e líderes religiosos acabaram como quaisquer sonhadores ingênuos: mortos.

No Ocidente, seguindo esse raciocínio, existem três grandes correntes de pensamento sobre a imortalidade. 

A visão cristã é herdeira das visões metafísicas sobre a imortalidade (embora tal conceito não seja compatível com o cristianismo), proclamando que a vida terrena se esvairá e uma nova vida, em um paraíso perfeito, será garantida àqueles que cumprirem os mandados de Jesus -  amar a Deus (o Amor) e ao próximo (a imagem e semelhança de Deus). Também em Platão, a visão da imortalidade da alma- e não do corpo- era clara, já que, para ele, somente as ideias e valores imutáveis existiam de fato e, como tais, eram eternos; no homem, a centelha imortal é a alma, a junção entre sabedoria, coragem e instinto (todos estes valores), onde cada virtude exerce a função de equilibrar a alma humana. A morte do corpo seria a libertação da alma para ascender ao paradisíaco mundo das ideias. A alma era ontológica - ou seja, mais real do que o corpo-  e o corpo, uma sombra a ser apagada pelo eterno devir da matéria.

O cristianismo, porém, têm seus pressupostos de vida eterna "contrabandeados'' para o racionalismo iluminista, que considera que, somente pelo domínio da natureza e da racionalização da sociedade, o homem pode almejar, pelo progresso técnico, prolongar sua vida terrena, desprezando qualquer vida supostamente metafísica em outro mundo; essa visão tem seus precedentes no Egito Antigo, cujos sacerdotes criam na ressurreição do corpo conservado pela mumificação. Contudo, o pressuposto cristão permanece: essa "vida eterna'' material prometida pela ciência parece pertencer a um mundo distante do atual, tal como se vê no cristianismo. A imortalidade deixa de ser a graça de Deus para ser a graça dos iluminados da humanidade, seus cientistas e pensadores. A maior expressão dessa tendência é o crú cientificismo que marca alguns círculos intelectuais de hoje, que consideram ser possível, através de descobertas científicas, a superação da morte.

Por outro lado, a própria política, na modernidade, está fundada nas promessas de uma vida em um paraíso terrestre: tanto liberais quanto marxistas se oferecem como a melhor chance de sobrevivência da humanidade e, embora não prometam a imortalidade da carne, afirmam em seu lugar a imortalidade das ideias. Defender a ideia da luta de classes ou a prosperidade individual como pressuposto da prosperidade coletiva é, de certa forma, uma fusão daquele que neles crê a tais institutos que, uma vez postos como célula-base das sociedades, serão eternos. Ou seja, ambas são visões idealistas, pelas quais são as ideias políticas as responsáveis pela imortalidade dos indivíduos. 

No fim, as tradições filosóficas fundadas no ceticismo e no niilismo rejeitam qualquer chance de imortalidade. Nietzsche crê que a promessa de uma vida metafísica eterna em um Reino perfeito é uma forma de controle social e uma imposição de normas morais pelos escravos e menos aptos aos naturalmente mais belos, fortes e inteligentes (a elite da humanidade), e uma forma de consolo e auto-enganação da humanidade por ela mesma que, fatalmente, acabaria em fracasso, possibilitando o que se chamou de "eterno retorno'' à qualidade, então esquecida, que o homem possui de determinar ele mesmo o que é o bem e o mal, algo surrupiado pelo cristianismo ao próprio homem (ou seja, Deus é, na verdade, uma criação pela qual uma elite de escravos justificou seus valores de desprezo pela carne e matéria, naturalmente irracionais à espécie humana). O super-homem tem ciência de sua mortalidade e, por isso, exerce ao máximo suas vontades e prazeres. 

É essa última visão que acaba por predominar nos círculos "mais cultos'' da sociedade. O pessimismo de que o sonho acabou e a imortalidade é um mito inalcançável é quase uma regra, apesar de vários cientistas resistirem. Contudo, grande parte da população humana ainda crê nas supostas promessas do cristianismo sobre a imortalidade, embora Cristo jamais tenha prometido uma "imortalidade'' nesse sentido: imortalidade quer dizer a não-morte, a incorrupção da carne, a permanência nesta vida, enquanto o cristianismo promete uma "segunda vida'', só alcançável justamente pela morte! 

Todavia, ainda hoje, os cientistas de todo o mundo buscam meios de superar a morte e prolongar a vida, descobrindo inúmeras curas de doenças e retardando os efeitos da velhice. Clínicas de criogenia são a última moda nos países ricos, sabia?

Mas porque temer tanto a morte? Porque desejar algo jamais experimentado por um ser humano conhecido (tirando figuras religiosas e míticas), a imortalidade? Freud falou, no fim de sua vida, do "desejo por Tânatos'' da humanidade, o desejo pela morte como uma "libertação'' da pura determinação do caráter humano pela sexualidade, da mesma forma como o cristianismo prometeu superar os males da matéria pela morte e ressurreição em Cristo. Assim, morrer pode não ser tão ruim assim, depois de uma longa vida, é claro.

Contudo, o fascínio pela imortalidade continua. Vários filmes e livros, como Highlander (onde um grupo de homens imortais travam uma luta eterna pelos séculos), Drácula (o velho conto do vampiro triste e imortal) e até mesmo as mais antigas obras produzidas pela humanidade (A Epopeia de Gilgamesh) tratam do tema. Aliás, a história de Gilgamesh, escrita na Suméria, no alvorecer da civilização, é emblemática: depois de épicas aventuras em busca da vida eterna, o herói, que anteriormente havia sido um poderoso rei, acaba envenenado e morto, lamentando seu fim, enquanto os deuses riem da prepotência do mortal que quis ser como eles. Já nessa época, o ensinamento era claro. A crença na imortalidade só traria dor na inevitável hora da morte e uma grande frustração. A morte deveria ser aceita como parte da vida.

Foi o que os romanos fizeram, ao elaborar o conceito de "cultura'', através das expressões latinas "colo'', "cultus'', "culturas''. A cultura (o conjunto de saberes sociais), para eles, eram "sementes'' a serem lançadas "no colo'' da "terra'', no ser humano, durante sua educação (a "cultivação'' da cultura), que brotariam na formação da personalidade do homem. Esse novo homem daria sua contribuição à cultura e, através de seus filhos, transmitiria as sementes (leia-se nessa expressão tanto os saberes abstratos quanto o "esperma'', pelo qual uma "parte'' do pai sobrevive nos filhos) ancestrais dos conhecimentos humanos- e seu sangue-  a seus descendentes. A imortalidade material seria essa eterna passagem de conhecimentos de uma geração a outra e da geração de filhos. Assim, os pais viveriam nos filhos, e os filhos, em seus próprios rebentos, e assim por diante. Na alma e no sangue.

Em suma, só se pode falar em imortalidade nesse sentido, a partir da herança genética e cultural das gerações que se sucedem no tempo. O restante é mito, embora a tentação e desejo pela vida material ininterrupta - a possibilidade de gozar dos prazeres da carne pela eternidade- seja ainda forte na civilização atual, que busca, de toda forma, banalizar a morte, até mesmo glorificando-a, já que, como dissemos, a sua inevitabilidade foi finalmente aceita com a filosofia de Nietzsche.

 Assim, a melhor figura a se adotar, como modelo de conclusão desse pequeno texto, é a da Fênix: o mitológico ser especial que era, de fato, mortal, consumindo-se, no maior de seus brilhos, na inevitável morte, para renascer em seguida. Mas o que não é muito divulgado sobre a Fênix mitológica é que seu renascimento é na verdade o surgimento de uma nova criatura, não da velha, a partir desta. A morte é o princípio da vida, eis o grande ensinamento desse mito ancestral.

A imortalidade é, de fato, um conceito vazio. Todavia, sua crença produziu inúmeras realizações filosóficas, científicas e culturais em geral: se a humanidade não tivesse buscado o impossível, jamais teria conquistado o que hoje é comum. Só por esse simples detalhe, sua crença foi positiva; contudo, mesmo o cristianismo superou tal ideia, como já dissemos, ao ver a morte como um processo natural de passagem a algo superior à vida terrena. E é justamente essa pergunta " o que há além da morte?'' que causa calafrios nos céticos. É hora de superarmos o medo e nos lançarmos nos braços de nossas crenças, rejeitando os mitos da imortalidade da carne - a mesma carne que tanto nos faz mal-, aceitando a condição da mortalidade inerente a tudo o que está vivo e, enfim, viver, com naturalidade, a maior mas aventuras possíveis ao ser humano: ir além da morte, descobrir o que há nessa região sombria e envolta em brumas. Depois, é claro, de uma longa e feliz vida material. Porque a Fênix da humanidade não deve parar de ser renovar e renascer, cada vez mais brilhante, quente, sábia, fraterna.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Sua Majestade, o governador de Pernambuco













As eleições do último domingo terminaram se convertendo na maior vitória política do antigo Partido Socialista Brasileiro, que acabou ascendendo da posição de mero aliado- e coadjuvante- de segunda ordem do PT para alçar um voo verdadeiramente nacional. Com o comando de 436 prefeituras por todo o Brasil, muito do êxito do partido é devido a seu líder máximo- o governador Eduardo Campos.

Eduardo é o herdeiro político de seu avô, Miguel Arraes, de quem recebeu o encargo de liderar as esquerdas pernambucanas - opositoras do golpe de 1964 e defensoras, em tese, da distribuição de renda, do envergamento dos servições públicos essenciais ao cidadão pobre e da condução do desenvolvimento econômico pelo poder público- em seu momento mais negro, quando Pernambuco parecia dominado pela sólida aliança entre a ala de direita do PMDB e o então PFL, no governo de Jarbas Vasconcelos. Nessa difícil época para as esquerdas, Eduardo era mal-visto por seu envolvimento em um escândalo relacionado ao pagamento dos precatórios, pelo qual foi impedido de participar da direção de entidades financeiras por oito anos. A força de seu avô, quando este ainda governava o Estado, lhe valeu alguns mandatos de deputado estadual, onde não se destacou muito; ainda jovem, Eduardo disputou a prefeitura do Recife, a contragosto do avô, e terminou fragorosamente derrotado. Contudo, a força de sua família lhe valeu um mandato de deputado federal, reconquistado na mesma época da vitória de seu grande amigo e aliado de seu avô, Luís Inácio Lula da Silva, nas eleições presidenciais de 2002. 

Na Câmara dos deputados (onde ficou conhecido como "Dudu Beleza''), Eduardo compôs a base do governo lulista e se tornou o maior líder da bancada pernambucana. Foi atuando como deputado - nas negociações por emendas ao orçamento, no qual sempre foi favorecido por Lula, na distribuição de cargos e lançamento de grandes projetos de infraestrutura- que Eduardo conseguiu se tornar ministro de Lula, conquistando a pasta de Ciência e tecnologia. No comando, Eduardo conseguiu ampliar seu poderio político e reafirmou uma série de alianças políticas, principalmente com o então deputado federal Armando Monteiro Neto e o velho aliado dos Arraes, o então prefeito de Petrolina, Fernando Bezerra Coelho. Armando representou a aliança com o  poder industrial - a família Monteiro é uma das mais fortes no setor secundário da economia pernambucana-, que passou a apostar em um Estado intervencionista, e a consumação do pacto político com Fernando Bezerra trouxe, na bagagem, uma série de lideranças políticas do interior de Pernambuco esquecidas e pisoteadas pelo governo de Jarbas Vasconcelos. 

Eduardo usou os recursos de sua pasta e sua influência sobre o presidente Lula (além da força política, mesmo que minorada, de sua família) para consolidar uma grande aliança com o setor industrial de Pernambuco, massacrado pelas políticas excessivamente liberais de Jarbas, e com as forças políticas do interior do Estado. Dois velhos atores políticos - as oligarquias e o capital industrial- que buscavam uma chance de crescer e, novamente, dominar a política pernambucana. Já em 2005, Eduardo preparou sua campanha ao governo do Estado, mesmo contra o candidato oficial do PT, Humberto Costa.

Um evento crucial, neste ano, seria um dos fatores propulsores da carreira do neto de Arraes: o advento do escândalo do mensalão. O presidente Lula viu-se atacado por todos os lados, abandonado por aliados históricos, bombardeado pela mídia, pressionado pelo próprio partido e, no fim, teve de enfrentar o sete pedido de impeachment no Congresso; seus articuladores políticos, José Dirceu e Genoino, envolvidos no escândalo, estavam impossibilitados de impedir que a frágil base aliada se desmontasse. Lula corria o risco de ser o segundo presidente a ser derrubado, por uma coligação de forças políticas que unia mídia, oposição e classes conservadoras. Campos, então, deixou o ministério e, reassumindo seu mandato na Câmara, articulou, como líder do governo, o arquivamento de todos os pedidos de impeachment contra o presidente e, ao mesmo tempo reorganizou a base aliada para manter a CPI que investigava o suposto esquema de corrupção sob controle. Ao reorganizar as bases de apoio do governo e mantendo-se fiel a Lula no pior dos momentos de seus dois governos, Eduardo se tornou um dos principais sustentáculos políticos do PT.

E, sob as bençãos do presidente Lula, a campanha de 2006 ao governo do Estado foi emblemática para o sucessor de Arraes. Eduardo dispunha de muitos recursos, doados pelas maiores indústrias do combalido complexo de Suape, além de uma estratégia de marketing fenomenal. As promessas de renovação da Administração Pública e da adoção de um novo modelo de gestão, além do compromisso dar atenção ao interior do Estado e fomentar o emprego, indústria e consumo cativou a classe média e as classes mais pobres, que, graças ao êxito da propaganda eleitoral do PSB, associaram corretamente o velho Arraes ao novo Arraes - Eduardo. O desgaste dos longos e relativamente improdutivos anos do governo Jarbas também pesaram na balança. Assim, mesmo inicialmente em um distante terceiro lugar nas pesquisas eleitorais, Eduardo derrotou Humberto e, no segundo turno, contra o adversário histórico da família Arraes em Pernambuco (o PFL, atual DEM, representado por Mendonça Filho), acabou saindo vitorioso.

No poder, Campos formou uma poderosa base de apoio com o PT, PDT, PC do B, PR e diversos partidos, mas evitou lotear a máquina pública para garantir suas alianças. Com o apoio total de Lula (que subiu tanto ao palanque de Humberto quanto ao de Eduardo), a quem  deu suporte na sua disputada reeleição, Eduardo tornou Pernambuco, através de seu bom jogo politico, o principal destino das verbas do recém-lançado Programa de Aceleração do Crescimento, que induziram uma forte retomada do crescimento econômico. Nessa lista de super-obras encontram-se a Refinaria de Abreu e Lima, a Transposição do Rio São Francisco e a construção da Ferrovia Transnordestina, além das verbas do PRONAF, que possibilitou o ressurgimento da agricultura familiar no Estado. Essas obras deram margem ao governo eduardista - no sentido em que, na medida em que aumentavam a atividade econômica, reforçava-se a arrecadação de impostos do Estado- para realizar um ajuste fiscal no Estado, cortando gastos inúteis e realizando uma pequena reforma tributária e administrativa na máquina pública. Pela primeira, reduziu-se o ICMS para importações e novos empreendimentos comerciais (mecanismos de isenção fiscal), estimulando a instalação de empresas no Estado, exatamente as industriais (que podiam, por essas bandas, exportar maquinários industriais a preço mais baixo que em outras unidades da federação). Pela segunda, implantou-se o sistema gerencialista de Administração, pelo qual instituiu-se metas a serem perseguidas, incentivou-se a meritocracia, maximizou-se o sistema de arrecadação de impostos e adotou-se uma severa política de fiscalização da execução dos gastos públicos. A regra era fazer o máximo com o mínimo, e o modelo acabou implantado em todos os níveis da Administração.


Afora essas reformas superestruturais, o grande problema social do Estado na época era o alto índice de homicídios, assaltos e delitos diversos. Eduardo instituiu o Pacto pela Vida, que derrubou Pernambuco do título de Estado mais violento do país, reduziu os homicídios em 25% só no primeiro ano (na região metropolitana do Recife) e em quase 50% no interior. O sucesso do programa rendeu a Eduardo o apoio incondicional das classes mais afetadas pela violência: as mais altas.

O interior do Estado recebeu várias verbas destinadas a obras de infraestrutura, expansão e melhora da rede de escolas públicas de referência e da Universidade de Pernambuco. Postos de saúde foram construídos em regiões remotas do sertão, onde anteriormente curandeiros e rezadeiras eram as únicas opções de tratamento médico de populações inteiras. A crônica falta de abastecimento de água no Agreste e no Recife foi sanada com a construção de grandes barragens; verbas foram dispostas às prefeituras do interior, cujos líderes, ainda majoritariamente da oposição, perceberam ser mais vantajoso apoiar o governador do que permanecer fieis aos já decadentes caciques oposicionistas. 

Logo em 2007, Pernambuco foi o Estado que mais cresceu no Brasil. As obras do PAC, a Administração gerencial, a melhora generalizada dos serviços públicos, a adesão de vários líderes regionais ao governo eduardista e o sucesso da reestruturação (ainda não concluída) da Políticia Militar no Pacto pela Vida permitiram ao governador esmagar, nas eleições municipais de 2008, a oposição. 

Mas as vitórias não pararam: Pernambuco, justo em época de crise mundial, foi invadido por grandes transnacionais, da McDonalds à Fiat, que instalaram-se, principalmente no ramo de bebidas, alimentos e roupas, também no interior, arrastando o desenvolvimento econômico, em outras épocas restritos ao litoral, também para os confins do Estado. A melhora do poder aquisitivo da população, o crescimento de mais de 40% da classe média (causa direta da queda da pobreza efetuada pelos programas sociais do governo federal, cujo grosso dos recursos é destinado às regiões nordestinas) e a demanda por empregos (pela indústria, serviços e afins, que se instalavam em Pernambuco para pegar carona nas obras do PAC e e aproveitar as benesses fiscais do governo, bem como a mão-de-obra barata) induziu à formação de um poderoso mercado de consumo, responsável por boa parte do crescimento de 10% ao ano do Estado no governo de Campos. Simplesmente, os programas sociais aumentaram o consumo dos mais pobres, o que formou uma demanda por bens industriais, resultando em maiores investimentos, geração de empregos e, enfim, mais e mais consumo: o indivíduo compra no mercado da esquina, o empresário tem lucros, investe-os no se negócio, expandindo-o, contratando auxiliares; estes consomem, geram lucros, que geram empregos, e por aí vai; no fim, o consumidor inicial, que deu origem a tudo isso, também encontra um emprego (e 85% dos empregos do Estado são gerados em pequenas empresas). A fórmula do sucesso foi tornada sustentável pelas reformas jurídicas já citadas (tributária e administrativa), que atraíram empresas ao Estado. O complexo de Suape se tornou um dos maiores do país, com mais de 40 mil empregos gerados ao ano, milhares de empresas (químicas, petrolíferas, indústrias de software, construção pesada etc), e a construção civil se tornou uma das mais prodigiosas da América Latina. Recife, Caruaru, Petrolina, Arcoverde e muitas outras cidades se tornaram canteiros de obras, cujos apartamentos e casas demandados pela nova classe média - que adquiriria então o primeiro imóvel, a casa própria- eram financiados pela Caixa Econômica Federal através do programa "Minha Casa, Minha Vida''.

A população acabou associando tanto as realizações de Eduardo quanto a melhoria de vida propiciada pelo governo federal através de seus programas sociais ao próprio governador. E, assim, formou-se o "mito''do grande gestor, o que explica sua esmagadora vitória nas últimas eleições estaduais.

O ano de 2010 viu o triunfo de um modelo político fundado por Eduardo, em crescimento econômico, alianças massivas com oligarquias do interior e com o capital industrial, além do apoio total do governo federal. Velhas forças e novas forças - como a nascente classe média recém saída da pobreza- garantiram a Eduardo uma vitória arrasadora contra Jarbas Vasconcelos, com uma diferença de mais de 3 milhões de votos. Nem os prefeitos do PMDB apoiaram o ex-governador, já que ninguém queria perder a carona do crescimento do Estado.

Mas Pernambuco ainda não é um paraíso. O Estado continua com um dos piores pisos salariais dos professores, embora o piso nacional tenha sido adotado- com o corte de benefícios, é claro. O índice de homicídios ainda é o terceiro maior do país (40 por 10 mil, se não me engano). A área da Saúde vem sendo muito bem gerida pelo secretário Antônio Figueira, embora existam críticas contra uma gestão que aparenta semelhanças coma  terceirização; os serviços da saúde ainda não alcançam toda a população e os hospitais continuam super-lotados. Apesar da melhora palpável do IDEB estadual, a educação ainda deixa a desejar, apesar da construção de 17 escolas técnicas estaduais e da expansão e abertura de vagas nos colégios de referência. A expansão da Universidade de Pernambuco pelo interior do Estado foi mais propaganda do que realidade, como sabem muito bem os alunos da instituição. Em Suape, falta mão-de-obra especializada, que é importada, a peso de ouro, de outros estados. As rebeliões dos trabalhadores por lá também são frequentes.

Talvez o que mais seja criticável em Eduardo Campos e em seu governo é sua metodologia de construção de alianças políticas. Esta consiste em congregar o máximo possível de aliados, distribuindo benesses (leia-se: verbas públicas) para garantir a subsistência de uma coalizão que possui mais de 18 partidos e atuais 45 deputados dos 49 deputados estaduais e 22 dos 25 deputados federais de Pernambuco, além dos 3 senadores. Eduardo conseguiu fazer o grande truque de mágica de unir quase todas as forças políticas do Estado em defesa de seu projeto: quem não está com Eduardo está contra o crescimento e mudança estrutural de Pernambuco. Muitos políticos não recebem benesses e só integram a base de apoio do neto de Arraes para pegar carona em seu prestígio e não serem associados ao atraso. É claro que, nesse processo, o pragmatismo político (Realpolik) atinge o nível máximo, e as ideologias (esquerda, direita, centro...) se tornam capas vazias convenientemente jogadas no lixo. O governo de Eduardo é o casamento perfeito entre "governismo de coalizão'' (aliança com as oligarquias do interior), neodesenvolvimentismo (as reformas jurídicas, o apoio ao capital industrial, os investimentos em infraestrutura) e tecnocracia (o modelo gerencial de Administração).

O fim dessa epopeia ainda está por vir. Eduardo, nesse meio tempo, está fechando alianças a nível nacional, usando sua metodologia já criticada. Com esse "esquema'', conseguiu eleger sua mãe como conselheira do Tribunal de Contas da União e interviu nas eleições municipais de São Paulo, Fortaleza, Belo Horizonte e Recife, conseguindo êxito louvável. A estratégia de Campos foi injetar uma disputa no PT do Recife, apresentando Maurício Rands como pré-candidato contra João da Costa e, em meio à divisão dos seus então aliados, que acabaram por impor a candidatura de Humberto Costa, "inventou'' um candidato seu, tomando o comando da maior prefeitura do Estado. Até o velho inimigo, Jarbas, anunciou seu apoio ao governo Campos. No fim, o apoio total às oligarquias foi dado: das 183 prefeituras do Estado, Eduardo conquistou 170, e somente 13 permanecem, (enquanto não declararem apoio a Eduardo), temporariamente, nas mãos da oposição. Massacre político para a oposição, restrita ao PSDB e ao DEM.


Essa grande vitória fortaleceu a tal ponto Campos que este, segundo rumores, está capacitado - e já trabalha- para concorrer à presidência da República. Isso incorreria em romper de vez com Lula, seu bem-feitor, e a quem deve o crescimento do Estado e o êxito de seu governo. Segundo já se sabe, o governador entrou em contato com os maiores empresários do país, como Jorge Gerdau e o grupo Votorantim, e é namorado por parte da imprensa nacional.

Ao Brasil, o discurso de Campos é claro: é hora de apagar o bipolarismo entre PT e PSDB e apostar numa nova força política, que possa simplesmente unir todas as demais agremiações em torno de um objetivo em comum, que, segundo o governador, passa necessariamente pela reformulação do pacto federativo. Basicamente, as funções governamentais técnicas devem ser, segundo ele, dadas aos técnicos (tecnocracia), a atuação do Estado deve ser eficiente (mas o Leviatã deve puxar a locomotiva da economia reduzindo os custos de produção para o capital), os programas sociais devem ser mantidos e a base política deve ser homogênea, onde o Legislativo coopera com o Executivo. A grande reforma política pretendida é uma descentralização da federação, proporcionando aos Estados mais autonomia e mais recursos, a despeito de uma diminuição de poder da União - Eduardo encarna a velha bandeira federalista, classicamente desfraudada pelas oligarquias da República Velha. O líder do PSB propõe a formação de um novo equilíbrio de poder, um renovado pacto político e uma forma de distribuir o poder para todos os grupos políticos, estando ele, Eduardo, no comando dessa aliança: trata-se de um federalismo viciado, resguardado por um presidencialismo forte, no melhor estilo da República Velha, com a privatização definiva da política nacional nas mãos dos caciques políticos e tecnocratas.

Enfim, Eduardo Campos se tornou um dos principais atores da política nacional. Seu discurso conciliador acena com a possibilidade de incluir todas as tendências políticas em um possível governo neo-desenvolvimentista... e, para isso, Campos não mede esforços, usando até mesmo velhas práticas condenáveis pelo manual de boa conduta da política nacional. 

Essa tentativa de formar uma unanimidade entre todas as tendências partidárias é nova na política nacional, embora esconda algum ranço autocrático, que muito lembra uma monarquia, ao estilo dos déspotas esclarecidos. Estes reis escolhiam ministros dentre os mais capazes do reino, induziam o desenvolvimento econômico e, como absolutistas, cativavam as oposições políticas (representadas pelos iluministas e liberais) distribuindo as benesses do governo entre eles; tratava-se de eliminar qualquer contestação ao poder dominante por meio da fundação de um regime político híbrido, entre absolutismo, racionalismo e capitalismo, mas sob hegemonia das mesmas forças políticas de sempre. No fim, foi mais um grande acordo entre elites. Lembra alguém? (Acima, Frederico II, seus ministros e nobres discutem com Voltaire, um dos maiores filósofos do iluminismo, mas também o ideólogo-mor do autoritário regime prussiano). O déspota esclarecido agia como fiador e garantidor desse grande pacto social por "mudanças lentas, graduais e seguras'', preservando aqueles que sempre estiveram no poder, mas atendendo parte das reinvidicações das oposições burguesas.

Desnecessário dizer que esse modelo evitou as revoluções liberais nos países que o adotaram (Áustria, Prússia e, até certo momento, a Rússia). E será esse o grande objetivo das elites políticas brasileiras, ao apoiarem Eduardo em uma possível empreitada rumo ao Planalto? Entregar, como por vezes se fez (JK, Médici, FHC...), o poder a um super-presidente esclarecido, para evitar transformações mais profundas na estrutura social brasileira e, mais uma vez, mudar tudo sem mudar nada? (Ao lado, Frederico II da Prússia, o maior dos déspotas esclarecidos. A semelhança é extraordinária...).

De fato, Eduardo Campos já é o governador pernambucano a exercer o maior poder dentre todos os que ocuparam o cargo. E, justamente onde Lula falhou, o neto de Arraes foi exitoso: conseguiu superar as pequenas rivalidades partidárias e distribuiu as benesses dos "amigos do rei'' para todos os que o apoiam, mesmo que essas benesses sejam simplesmente "não estar contra Eduardo'', como já vimos. Ou seja: para sobreviver politicamente, mesmo sem ganhar nenhuma vantagem a mais, os adversários de Dudu precisam se unir ao PSB. Isso envolve um poderoso trabalho de marketing junto à população e supera a verdadeira causa dos antagonismos partidários no Brasil: o fato de que o poder político é limitado e só ter possibilidades de ser exercido por poucos indivíduos e seus grupos; não havendo espaço para todos, começam as brigas. Eduardo simplesmente centralizou o poder em suas mãos, fazendo de todos seus apoiantes os "amigos do rei'', mas até quando conseguirá manter essa "unidade''? A resposta, como já dito, é clara: propondo a instalação de um federalismo efetivo resguardado por um presidencialismo forte. Trata-se de descentralizar os recursos públicos e áreas de influência, sem perder de vista um projeto nacional.

Assim, se Eduardo Campos trocará a coroa de rei de Pernambuco pela de imperador do Brasil, só o tempo e a força de suas alianças privadas dirá. Mas se a política brasileira continuará a se dar como um jogo de cartas a ser travado à portas fechadas, onde os jogadores são poucos (e sempre os mesmos...) e apostam (embolsam) o dinheiro que não é deles (mas da sociedade), só o povo, com o infinito poder do voto, poderá decidir. E longa vida ao rei!

domingo, 7 de outubro de 2012

As eleições em Garanhuns- o Fim


Estou frustradíssimo com essas eleições. Mais uma vez, o que acabou contando para a definição do resultado foram conchavos políticos que visaram interesses privados (a aliança Antonio João/Izaias/Armando Monteiro), a enorme, absurda, abominável compra de votos (principalmente entre os candidatos a vereador) e a "compra e venda de apoio político'', cuja marca maior foi o declínio de Silvino e seu apoio incondicional a Izaias. 

O povo foi manobrado por um discurso apocalíptico massivamente divulgado pela classe média, que conseguiu induzir até mesmo a população da zona rural a rejeitar Zé da Luz, além de bombardeado pelo poder econômico sem precedentes da coligação régista. Fez-se um pacto social explícito de repúdio às práticas políticas demagógicas e assistencialistas do Zé, e, também, contra seus eleitores: pessoas da periferia, acusadas de alcoolatras, ignorantes e, em muitos casos, associadas ao anarquismo social e bandidagem. Zé realmente seria a pior opção de Garanhuns, mas a eleição deixou de ser um pleito e se tornou quase uma luta de classes. No fim, Zé manteve o eleitorado de costume(um curral?), que conquistou desde 2008, o que o capacita para a candidatura a deputado estadual. Não será absurdo imaginar que Izaias possa apoiar Zé nesse intento.

A composição da câmara de vereadores não é, agora, tão ruim. Dos quatro atuais vereadores que se reelegeram, apenas dois (Sivaldo e Gersinho), o mereceram de fato. Doeu ver que parentes de políticos impedidos de se candidatar pela ficha-limpa conseguiram uma vaga. Mas algumas lideranças populares garantiram espaço na Casa, e Izaias conseguiu eleger dez vereadores das suas coalizões apoiantes. Vai ter maioria folgada na câmara para fazer- ou não- tudo o que prometeu. A maior expectativa, porém, é se a Câmara vai retomar um papel ativo em Garanhuns, superando sua atual posição de curral do Executivo, e abandonar suas práticas assistencialistas para exercer suas reais competências- legislar, fiscalizar o executivo, "ver as dores'' do povo.

Quanto a meu candidato, Paulo Camelo, fico feliz pela sua votação histórica. Infelizmente, a população de Garanhuns não está madura o suficiente para apostar em um homem tão visionário, inteligente, capaz, corajoso, e caiu no canto da sereia do poder econômico e da propaganda maciça do candidato do PTB. Mas Paulo vai continuar atuando no cenário político e elevando a qualidade do debate sobre os interesses públicos.

No fim, o governo que se iniciará em 2014 será o terceiro ao qual farei oposição. Os desafios de Izaias já começaram, já que existem 10 vereadores a satisfazer, inúmeros cabos eleitorais sedentos de recompensas, e vários aliados que desejam, humildemente, algumas secretarias da cidade. O problema é que eles são muitos, e manter essa enorme gama de coalizões unidas - o pessoal do prefeito Luiz Carlos, Silvino, petistas, Antonio João e muitos outros- será uma missão quase impossível para Izaias. Por outro lado, a cidade precisa de um ajuste fiscal, urgentes reformas institucionais, uma política econômica desenvolvimentista que gere empregos e renda, revitalizações de praças e pontos turísticos, além de articular apoios a nível estadual e nacional, para atrair recursos para a cidade. 


Só tenho a desejar ao prefeito eleito que ele consiga superar estes desafios, unir a cidade em torno de um projeto de longo prazo e transformar Garanhuns na potência econômica que já foi no passado. Mas as expectativas são negativas. Acima, a música Como nossos pais, de Belchior, expressa, perfeitamente, o que realmente ocorreu nessas eleições... "meu bem, há perigo na esquina... eles venceram e o sinal está fechado pra nós, que somos jovens! (...) minha dor é perceber que, apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais... nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não me enganam... vocês dizem que depois deles não apareceu mais ninguém... você pode dizer que eu tô por fora ou inventando, mas é você que não vê que o novo sempre vem! Hoje eu sei que quem me deu uma nova ideia de consciência e juventude está em casa, contando o vil metal!''

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Esclarecimentos: o possível fim do blog



Olá leitores,

Eu peço desculpas pela inatividade do Blog. Nos últimos tempos andei atarefado - e sem inspiração- demais para escrever por aqui. Estou pensando seriamente em encerrar o Blog, já que o raio de alcance deste só se dá entre os 20 ou 30 leitores habituais (geralmente, amigos meus), embora as visualizações de página sejam relativamente muitas. Além disso, falhei em reunir mais colaboradores para o Blog.

Confesso que sou bastante criticado pelo que escrevo aqui. Epítetos de "louco'', "vagabundo'' e "alienado'' choveram nestes últimos meses, bem como olhares atravessados, torcidas de nariz e outros pequenos sinais de repúdio taciturno. Os elogios e felicitações - por cavalheirismo, simpatia com a minha incarismática pessoa, pragmatismo e real concordância com as ideias aqui expostas- também foram muitos, e por eles agradeço. Outros fatores, de ordem interna - desmotivação, frustrações diversas, descrença em mim mesmo, perda do sentido existencial e por aí vai- também me levam a pensar encerrar o Blog. Afinal, não se pode tentar mudar o mundo, ainda mais sem preparo, direção, objetivo em si: mudar só por mudar não é uma ideia saudável.

Vou meditar nesta sexta-feita e, durante a noite, vou apresentar os rumos deste pequeno espaço de resistência contra a pós-modernidade. 

Um abraço.