O lugar da cerimônia não foi uma igreja. Tampouco esteve presente um juiz de paz. Na plateia, os homens mais ricos do Brasil, comandados por Eike Batista, o mágico empresário do setor petrolífero que ganhou bilhões sem extrair uma única gota do precioso ouro negro das profundezas do mar, foram as testemunhas do esperado casamento da presidente (e do governo) Dilma Rousseff. A certidão de casamento consistia em um documento oficial, assinado por Passos, ministro dos Transportes, Guido Mantega, da Fazenda, a bela Glaisy Hoffman, da Casa Civil, e pela noiva, Dilma. O nome do noivo era simples: privatização.


O PSDB, o partido autor das grandes privatizações de bens públicos do Brasil durante a era FHC, saudou Dilma, antes mesmo de seus aliados políticos. O próprio Fernando Henrique parabenizou a presidente por beijar a cruz das privatizações- que, segundo ele, seriam uma rendição do petismo ao "sucesso'' do modelo privatista, diante da ineficácia das medidas paliativas adotadas por Dilma para responder à crise internacional. Essas medidas, porém, - isenções fiscais, desoneração da folha de pagamento e fartura de crédito para indústrias da transformação, bem como desvalorização do câmbio, presentes no Plano Brasil Maior- apenas integravam, o tempo todo, o plano do governo para enfrentar a crise, no qual as privatizações foram previstas para dinamizar a economia, ativando, por meio de grandes obras, toda a cadeia produtiva nacional, fazendo circular riqueza, diminuindo a poupança e aumentado o consumo interno, fazendo o combalido PIB brasileiro crescer. Nesse sentido, a redução dos juros para 8% ao ano liberou capital do rentismo e da poupança para as atividades produtivas- as concessões de Dilma, por exemplo, teriam taxa de lucro de cerca de 13%, uma verdadeira tentação para os bancos, empresas e concessionárias.
O capital externo está autorizado a investir. O pacote revela o centro nervoso da política econômica do governo: apenas manter o status quo sem realizar grandes reformas jurídicas e estruturais- como a tributária, trabalhista e previdenciária. Ainda mais, tem-se graves suspeitas de que nas obras de tais rodovias e ferrovias serão um prato cheio para corruptos de plantão desviarem algumas verbas públicas e empresários ambiciosos superfaturarem aqui e ali.
O objetivo da equipe econômica é baixar o custo-total das mercadorias produzidas no país (através da integração entre queda dos juros, o Plano Brasil Maior e o Programa de Investimentos em Logística) e aumentar o nível de demanda da economia com as obras que se seguirão. Para tal, negou reduzir os custos com a máquina pública e com despesas financeiras- a famosa dívida pública- e resolveu delegar a condução da economia aos agentes privados. O tal Programa é apenas um precedente do que virá pela frente, suspeita-se. Trata-se de uma privatização em sentido amplo, já que o usufruto dos meios de transporte passará às empresas por décadas, voltando ao governo depois de gastas e ultrapassadas... o problema é: se o pedágio cobrado pelas empresas for muito alto, o feitiço vira contra o feiticeiro e os produtos nacionais encarecem, em vez ficarem competitivos. A produção diminuirá, junto coma demanda pelos produtos nacionais, mais caros, contra os mais baratos, estrangeiros.
Dilma busca gerenciar a economia sem muitos apelos políticos. Enquanto Lula fugia das privatizações, por causa da opinião pública, Dilma lixa-se para ela e para a esquerda e decidiu ser feliz. E ser feliz para ela é perseguir números, metas e objetivos planificados, e pouco importa se deverá cuspir em seus ideais e privatizar até a Petrobrás para cumprir seus insanos planos burocráticos. Mas, para o bem do Brasil, esperemos que a união pragmática entre a presidente e seu novo marido, a privatização, dê errado, apesar dos incentivos e bençãos de Eike Batista e seus colegas bilionários. Afinal, não há muito tempo, um certo sociólogo, em seu governo, afirmou que privatizar estatais era necessário para fazer o país crescer- e a taxa de crescimento de seu governo foi de 1,9 % anuais, com longas recessões (1997, 1998, 1999 e 2001). Um certo pensador disse que a história se repete: a primeira vez, como tragédia, a segunda, como farsa. E a farsa (e mentira) é de que privatizar bens públicos no Brasil dinamiza a economia e induz o crescimento.
"No crescimento e na estagnação, no pibão e no pibinho, até que a derrota nas urnas ou a recessão nos separem'' teria sido um ótimo voto nupcial, não?
Nenhum comentário:
Postar um comentário