Apesar de hoje, em tempos de globalização, a influência cultural clássica da França esteja em franco declínio, sua maravilhosa história elucida, em muitos pontos, a tragetória do Estado nacional moderno, da civilização ocidental e, nessa última incluído, do próprio Brasil. Comumente, as nascentes monarquias medievais marginais, como Portugal, tomavam como exemplo o mais poderoso e avançado dos reinos cristãos, a França dos Capetos e, posteriormente, dos Valois. A própria Dinastia real portuguesa, por volta da época em que se passa o fragmento literário sobre o qual nos basearemos, era de origem francesa (a família Borgonha), bem como as principais casas nobres da Europa.
Assim, muitos costumes e práticas culturais francesas acabaram, no bojo do Estado monárquico português, atravessando o oceano e se fixando no Brasil, quando da colonização das américas. Assim, apesar da frança ter legado, diretamente, muito pouco ao Brasil, sua herança indireta ajudou a fundar o próprio Estado nacional, o subsistema de classes, o poder das oligarquias rurais (que nada mais eram - ou são- do que uma nobreza semi-feudal, a quem faltam apenas - não no Império, diga-se- apenas os títulos nobiliárquicos), a burocracia pública e a prática cotidiana dos políticos brasileiros de forjar alianças com base em ritos e práticas ilegais e imorais - aqui me refito explicitamente ao presidencialismo de coalizão, os financiamentos irregulares de campanha, a apropriação da Coisa Pública em nome de interesses escusos. (Ao lado, Carlos de Valois, fundador do ramo dinástico dos Valois).
Segue uma excelente passagem do penúltimo livro de uma das maiores séries literárias da França- Os Reis Malditos -, A Lis e o Leão, que retrata a ascensão do Conde Filipe ao trono francês, fazendo-se coroar como Filipe VI de Valois, depois da morte de Carlos IV, último rebento masculino direto da dinastia de Hugo Capeto. Basicamente, a França - povo, nobreza e Igreja- dos anos 1320 suponha estar amaldiçoada a dinastia capetíngia, do Rei Filipe IV, o Belo, (o Rei de Ferro), por causa da morte injusta do grão-mestre templário Jacques de Molay, executado sete anos depois de dissolvida a ordem, e que lançara, no último de seus suspiros, uma praga contra o rei, o Papa e o cavaleiro Nogaret (ambos morreram em menos de um ano, tal como o executado templário o disse). Maurice Druon, autor dessa saga épica, identifica esse sentimento negativo e de repúdio aos Capeto (que unificaram o reino, protegeram o comércio, revolucionaram a Administração Pública , diminuiram o poder dos barões, acabaram com a servidão, racionalizaram os impostos, unificaram a moeda, pesos, medidas, e a própria língua francesa e, assim, transformaram um reino pobre e constantemente acossado pelos vizinhos em maior força da cristandade) como uma reação contra o Estado moderno e burocrático, de índole progressista, que nasceu, principalmente, do governo do chamado Rei de Ferro. Mais precisamente, se trata da resistência das práticas feudais e de diversos costumes - a usura dos comerciantes, a compra de cagos e indulgências na Igreja, a super-descentralização do poder politico, pelo qual qualquer senhor feudal dispunha a livremente da vida de seus servos e, estes, por óbvio, podiam usar suas conecções com os barões para se furtar às obrigações impostas aos demais, numa forma primitiva de clientelismo- contra o progresso e a modernização do país.
Muito semelhante, claro, à todas as elites mal-acostumadas com seus privilégios - bem como classes populares, é claro!- que insistem em defender seus interesses mesquinhos contra o bem-comum. Como, é claro, nossa elite neoliberal o faz, renhida e prestigiosamente, institucionalizando a luta de todos contra todos, da mesma forma que o sistema feudal fazia (pelo menos, entre nobres e nobres, sendo as vítimas, os populares...). A luta entre Estado e particulares, hoje ou em 1326, continua atual, proeminente e, sobretudo, diz respeito a todos nós.
"O povo suspirava. A maldição de Tiago de Molay
parecia esgotada. A linhagem dos Capetos, que, em trezentos e quarenta e um
anos, tinha dado, sem interrupção, catorze reis à França, mas dos quais os
quatro últimos tinham sido varridos em menos de quinze anos, estava extinta,
pelo menos em seu ramo mais velho. A ausência de filho homem, em todas as
famílias, das mais ricas às mais pobres, é sempre considerada, se não como infelicidade,
pelo menos como inferioridade. Para uma casa real, essa incapacidade dos filhos
de Filipe, o Belo, no que se referia à procriação de descendentes masculinos,
era julgada como a manifestação de um castigo.
As coisas iam mudar. Febres súbitas
assaltam os povos, e suas causas devem ser procuradas no deslocamento dos
astros, de tal forma escapam a qualquer outra explicação: vagas de cruel
histeria, como tinham sido a cruzada dos pastorzinhos ou a chacina dos leprosos,
vagas de euforia delirante, tal como a que acompanhou a subida de Filipe de
Valois ao trono. O novo rei era de belo porte e possuía aquela majestade
muscular necessária aos fundadores de dinastia. Seu primeiro filho era um
menino, que já contava nove anos de idade e parecia robusto. Tinha, também, uma
filha, e sabia-se, pois as cortes não fazem mistérios dessas coisas, que ele honrava
quase que todas as noites sua esposa grande e coxa com um entusiasmo que os
anos não amorteciam. Dotado de voz forte sonora, não era um tartamudo como seus
primos Luís, o Turbulento, e Carlos IV, nem um silencioso como Filipe, o Belo,
ou Filipe V.
Quem podia se opor a ele, quem podiam lhe opor? Quem pensava em
ouvir, naquele regozijo em que a França se agitava, a voz de alguns doutores em
direito, pagos pela Inglaterra, para formular representações, sem convicção? Filipe
VI chegava ao trono por consentimento unânime. Entretanto, não passava de um
rei por acaso, um sobrinho, um primo de rei como tantos outros, um homem afortunado
entre a sua parentela. Não era um rei nascido de rei para ser rei, não era um
rei designado por Deus, um rei recebido. Era um "rei achado" num dia
em que faltara um rei. Aquela expressão, inventada na rua, em nada diminuía a
confiança e a alegria do povo.
Tratava-se apenas de uma dessas expressões de
ironia com que as multidões gostam de colorir suas paixões, e que lhes dão a
ilusão de familiaridade com o poder. João, o Louco, quando repetiu a palavra a
Filipe, recebeu um pontapé que o atirou como uma bola sobre o lajedo. Contudo, acabava
de pronunciar a palavra senhora de um destino. Pois Filipe de Valois, como todo
parvenu, quis mostrar que era bastante digno, pelo valor natural, da
situação que lhe coubera, e exagerou, em seus atos, a idéia que se pode fazer
de um rei.
Porque o rei tem o exercício soberano da justiça, ele mandou, dentro
de três semanas, enforcar o tesoureiro do último reinado, Pedro Rémy, do qual se
dizia ter traficado bastante com o Tesouro. Um ministro das Finanças na forca é
coisa que sempre rejubila o povo, e a França imaginou que tinha um rei justo.
O
príncipe é, por dever e função, o defensor da fé. Filipe lançou um decreto que
reforçava os castigos contra os blasfemadores e aumentava o poder da
Inquisição. Assim, o baixo e o alto clero, a pequena nobreza e os beatos de
paróquia ficaram tranqüilizados: tinha-se um rei piedoso.
Um soberano deve
recompensar os serviços prestados. Ora, quantos serviços tinham sido
necessários a Filipe para garantir-lhe a eleição! Mas um rei deve igualmente
zelar para não fazer inimigos entre os que se mostraram, sob seus
predecessores, bons servidores do interesse público. Assim, enquanto eram
mantidos em seus cargos quase todos os antigos dignitários e oficiais reais,
criavam-se novas funções ou duplicavam-se as existentes, para dar lugar aos
mantenedores do novo reinado e para satisfazer as recomendações apresentadas
pelos grandes eleitores. E como a casa de Valois já possuía padrão régio,
aquele padrão superpôs-se ao da antiga dinastia, e foi uma grande corrida aos
empregos, aos benefícios largamente distribuídos. Tinha-se um rei generoso. [Acima, o rei Eduardo III presta homenagem a Felipe VI].
Um
rei deve ainda trazer prosperidade a seus vassalos. Filipe apressou-se a
diminuir, e mesmo, em alguns casos, a suprimir as taxas que Filipe IV e Filipe
V tinham lançado sobre o comércio, sobre os mercados públicos e sobre as
transações de estrangeiros, taxas das quais se dizia que entravavam as feiras e
os negócios. Ah! o bom rei que fazia cessar o tormento representado pelos
coletores do ministro das Finanças! Os lombardos, que tinham emprestado tanto a
seu pai, e aos quais ele próprio devia ainda tanto, abençoavam-no. Ninguém
pensava que o fisco dos antigos reinados produzia efeitos a longo prazo, e que
se a França era rica, se ali se vivia melhor do que em qualquer outra parte do
mundo, se todos se vestiam com bons tecidos e muitas vezes de peles, se havia
banhos e estufas até nos lugarejos, devia-se isso aos últimos Filipes, que
tinham sabido assegurar a ordem no reino, a unidade da moeda e a segurança no
trabalho.
Um rei... um rei deve também ser um sábio, o homem mais sábio entre seu
povo, e Filipe começou a tomar um tom sentencioso para enunciar, com sua bela
voz, graves princípios onde era possível reconhecer a maneira de seu antigo
preceptor, o arcebispo Guilherme de Trye. "Nós, que sempre quisemos
conservar razão...", dizia ele, a cada vez que não sabia que partido
tomar. E quando sentia ter tomado o caminho errado, o que lhe acontecia com freqüência,
vendo-se obrigado a desdizer o que tinha ordenado na antevéspera, declarava,
com a mesma soberba: "Coisa razoável é modificar seu propósito". E,
ainda: "Sempre vale mais prevenir que ser prevenido", enunciava,
pomposamente, aquele rei que, em vinte e dois anos de reinado, jamais cessaria
de passar de surpresa a surpresa infeliz! Jamais monarca algum lançou de tão
alto tantos lugares-comuns. Pensava-se que ele estava refletindo; na verdade
pensava apenas na frase que devia formular para se dar o ar de ter refletido.
Mas sua cabeça estava tão oca quanto uma noz de inverno.
Um rei, um verdadeiro
rei, não nos esqueçamos, deve ser bravo, valente faustoso! Na verdade, Filipe
não tinha outra aptidão a não ser a das armas. Não para a guerra, mas para as
armas das justas e torneios. Como instrutor de jovens cavaleiros, teria feito
maravilhas na corte de um barão mais modesto. Soberano, seu palácio se
assemelhava a um dos castelos dos romances da Távola Redonda, muito lidos na
época, e com os quais ele alimentara a imaginação. Foram inúmeros torneios,
festas, banquetes, caças, divertimentos, depois mais torneios, com orgias de
plumas sobre os elmos e cavalos mais ornamentados do que as mulheres. Filipe
ocupava-se muito gravemente de seu reino, uma hora por dia, depois de uma justa
de onde voltava escorrendo suor, ou de um banquete de onde saía com o ventre
pesado e o espírito nebuloso. Seu chanceler, seu tesoureiro, seus inúmeros
oficiais tomavam decisões por ele, ou então iam buscar ordens junto a Roberto
d'Artois. Este último, em verdade, mandava mais do que o soberano. Nenhuma
dificuldade se apresentava a Filipe sem que ele apelasse para o conselho de
Roberto, e todos obedeciam ao conde d'Artois, sabendo que qualquer decreto de
sua parte seria aprovado pelo rei.
Dessa maneira, chegou-se à sagração, onde o
arcebispo Guilherme de Trye colocaria a coroa sobre a fronte de seu antigo
aluno, e cujas festas, no fim de maio, duraram cinco dias. (...) Havia cem anos
que no reino de França não se bebia tanto: servia-se a cavalo, nos pátios e nas
praças. ''
(DRUON, Maurice. O Leão e a Lis. Círculo do Livro: São Paulo, 1977. Pgs. 30-32)
Algumas observações rápidas sobre os trechos destacados tem um grande valor histórico para os que apreciam Ciências Políticas, História, Sociologia e até Direito. Veja que, ao subir ao poder, Felipe mandou assassinar o ministro das finanças do último reinado, responsável pelo enriquecimento do reino. Assim, transferia a carga negativa dos atuais problemas do reino a um homem já odiado que, como bode expiatório, foi sacrificado para deleite do povo. Isso representa, além de uma ferramenta de controle político (matar cobradores de impostos se tornou prática comum entre os reis europeus para aumentar sua popularidade), uma forma de rompimento com a política fiscal expansionista da monarquia, levada a cabo pelos últimos reis. A supressão dos impostos, por sua vez, tinha o intento de enfraquecer o Estado e e agradar às facções feudalistas - e que desejavam o poder mínimo ao rei- e comercialistas, que puderam pintar e bordar sem a força da monarquia a lhes vigiar. Esse Estado fraco não conseguiria, tempos depois, resistir a Guerra dos Cem Anos e quase foi destruído, junto com a própria França. (Acima, o Rei Felipe VI, bispos, nobres e ministros em reunião).
Por outro lado, o rei aumentou o poder da Inquisição, que, na época, era uma ferramenta política da sociedade feudal para esmagar as contestações ao sistema - e a própria religião. Assim, delegou parte do poder repressivo do Estado a um organismo privado. Com certeza, o mais impressionante dos feitos do rei foi dobrar o tamanho da máquina pública (aproveitando as receitas fartas deixadas em reerva pelos últimos reinados) para nela empregar todos seus apoiantes e os indicados dos grandes nobres e banqueiros italianos que haviam contribuído para a ascensão de Valois. Tratou-se da fundação de um Estado servido por indivíduos meramente parasitários, ao contrário da ideia que predominou durante o governo do Rei de Ferro: a de que os servidores do Estado deveriam dedicar-se a tarefas técnicas e, de acordo com o mérito, obter promoções. A burocracia foi derrotada pela mediocracia (de medíocre, mesmo) ou parasitocracia... (acima, moeda oficial do reinado de Filipe VI).
Por sua vez, a última das estratégias de dominação de Valois foi a promoção de caros e faustosos torneios, que, ao mesmo tempo, faziam delirar a nobreza e o populacho. Ninguém questionava o fato do reino estar desgovernado, onde emergiam inúmeras revoltas e conflitos, agravado pela queda da capacidade do Estado de manter exércitos. Tratou-se de uma aplicação da antiga política do panis et circenses (ainda mais, sobre as próprias elites reinantes) só que, dessa vez, a maioria da população não tinha pão. Ou, pelo menos, deixaria de ter, após as guerras, pestes e fomes que viriam.
Por último, atente-se para o verdadeiro poder por trás do trono. Roberto III, conde titular do Artois, foi um dos grandes atores políticos da França e uma peça fundamental na Guerra dos Cem anos e sua eclosão. Sempre, claro, movido por interesses pessoais: reaver seu condado, o Artois, tomado injustamente por sua tia, Mafalda. Foi tendo isso em mente que Roberto, quando da morte de Carlos IV e da eleição de um novo rei - o que ocorria quando a dinastia reinante extinguisse seus descendentes masculinos- articulou a vitória de Valois, distribuindo cargos, favores e mimos entre os eleitores, os doze pares da França. Foi Roberto o verdadeiro arquiteto dessa reação ao Estado moderno que se formava no reino, encarnando os interesses pessoais dos nobres e burgueses, pelo menos no momento, dirigidos contra a centralização do poder político nas mãos do rei; todos os decretos do rei, promulgados sob seu conselho, objetivavam, para o conde, preparar o terreno para que este próprio alcançasse seus objetivos. No mais, o poderoso conde cairia em desgraça pouco depois, quando tentou falsificar documentos a fim de provar sua pretensão ao Artois (Acima, luminária francesa da época retrata o processo aberto pelo Parlamento contra D'Artois). Proscrito, teve de fugir do reino e, indo aportar na Inglaterra, lançou nos ouvidos do Rei Eduardo III, que tinha pretensões à coroa da França, que a coroa poderia ser dele, tal era o estado de fraqueza do reino franco. E, assim, tivemos a Guerra dos Cem anos...
Essas práticas políticas, principalmente a gerência do Estado por grupos e interesses estritamente privados (privatização do Estado), a força política dos latifundiários ( a UDR de hoje não é uma aristocracia feudal bilionária?), a distribuição de cargos e a farra com o Tesouro Público em atividades pequenas, incidentais e de mera distração da multidão são hoje os pilares da política brasileira. Sua origem está diretamentre projetada sobre o período feudal e seu expoente, o Reino da França. A diferença primordial entre a França Valois e o Brasil de hoje, além do recuo histórico, é a inexistência, em terras tupiniquins, de um código moral e religioso rígidos que coibam os abusos das classes dirigentes- antes, há a glorificação do "jeitinho'', do drible às leis, das pequenas ilegalidades que, como na França, funcionam como meios de aferir o status do indivíduo.
Por outro lado, os pobres brasileiros continuam sujeitos - e pior, os elegem ou admiram de boa vontade!- a governantes e líderes egocêntricos (religiosos, políticos, militares... será que Malafaya, Eike Batista, FHC, Sarney, Calheiros, Serra, Collor, Eduardo Campos e outros são tão diferentes dos Valois?) e incompetentes, como Filipe VI. Esses senhores são uma verdadeira "família real'' brasileira, unida em despojar o país e manipulá-lo a bel prazer, objetivando a satisfação de seus desejos mesquinhos.
O nosso sistema presidencialista, por outro lado, é claramente resquício de uma forma de monarquia, onde o presidente-rei, dotado de grandes poderes, os usa para consolidar sua base de apoio, distribuindo benesses a um punhado de "amigos do rei'', pagas com os impostos suados dos cidadãos; a política nacional nada mais é que a disputa de interesses privados, de classes dominantes (que agem como uma verdadeira nobreza!), pelo controle dos recursos produzidos pelo esforço coletivo, para satisfazer os próprios intentos dos poderosos, da mesma forma que no período medieval e, identicamente, essa disputa privada é maquiada por ideais (o ideal do cavalheirismo e o cruzadismo ontem, a eficiência da economia e o "desenvolvimento'', hoje) que acabam amenizando o controle coletivo sobre os atos dos grupos políticos. Basicamente, a França via o reinado de vários pequenos "monarcas'' sociais: senhores feudais, burgueses, banqueiros (já numerosos e poderosos), facções da Igreja, a própria família real. O Brasil, por sua vez, está sob o reinado dos seis gigantes: oligarquias políticas, latifundiários, industriais, banqueiros, a mídia e empreiteiras,, que formam nossos "patrícios''. Mudaram os rostos, mas as coroas continuam plantadas sobre o monopólio da política, do dinheiro, da apropriação econômica dos bens coletivos e, sobretudo, do controle da informação (a mídia, como a Igreja, pronuncia os dogmas e dita as modas hoje em dia, bem como controla o comportamento individual...).
O nosso sistema presidencialista, por outro lado, é claramente resquício de uma forma de monarquia, onde o presidente-rei, dotado de grandes poderes, os usa para consolidar sua base de apoio, distribuindo benesses a um punhado de "amigos do rei'', pagas com os impostos suados dos cidadãos; a política nacional nada mais é que a disputa de interesses privados, de classes dominantes (que agem como uma verdadeira nobreza!), pelo controle dos recursos produzidos pelo esforço coletivo, para satisfazer os próprios intentos dos poderosos, da mesma forma que no período medieval e, identicamente, essa disputa privada é maquiada por ideais (o ideal do cavalheirismo e o cruzadismo ontem, a eficiência da economia e o "desenvolvimento'', hoje) que acabam amenizando o controle coletivo sobre os atos dos grupos políticos. Basicamente, a França via o reinado de vários pequenos "monarcas'' sociais: senhores feudais, burgueses, banqueiros (já numerosos e poderosos), facções da Igreja, a própria família real. O Brasil, por sua vez, está sob o reinado dos seis gigantes: oligarquias políticas, latifundiários, industriais, banqueiros, a mídia e empreiteiras,, que formam nossos "patrícios''. Mudaram os rostos, mas as coroas continuam plantadas sobre o monopólio da política, do dinheiro, da apropriação econômica dos bens coletivos e, sobretudo, do controle da informação (a mídia, como a Igreja, pronuncia os dogmas e dita as modas hoje em dia, bem como controla o comportamento individual...).
Quanto ao resto - o cenário de despreocupação diante da anarquia, a alienação do povo e das elites (o personalismo na política é algo dolorosamente presente, na monarquia francesa e no "caudilhismo'' brasileiro), enfraquecimento do Estado e presença de adversários externos- tudo se assemelha... será que o Brasil evoluiu tão pouco ao ponto de que uma crônica medieval nos diga tanto sobre nossa própria nação? Enquanto tentamos responder, aproveitemos essa imortal idade média brasileira... e vida longa a nossos reis!
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