segunda-feira, 26 de setembro de 2016

As eleições em Garanhuns: "tempo perdido''?



É comum que, quando se trata das eleições em Garanhuns, jornalistas e comentaristas a considerem como uma das menos interessantes do Estado por sua “definição precoce’’. O jogo, como dizem, parece já estar jogado, mas reducionismos favoritistas não expressam a realidade política do município. Para tal, é preciso uma análise triangular das peculiaridades da política garanhuense, sob uma linha histórico-estrutural, conjuntural e potencial.


1- "Tempo perdido'': a história política recente de Garanhuns e suas macroestruturas políticas

Em 2012, Garanhuns viu o encerramento de um ciclo. Se iniciava uma nova era em sua história, sacramentada por uma expressiva vitória do então deputado estadual Izaías Régis sobre o “perigoso’’ Zé da Luz, um forasteiro acusado de ser “ficha-suja’’.

Mas como as coisas evoluíram a este ponto? Para entender como o atual grupo político chegou ao poder e caminha para conservá-lo por mais quatro anos, é preciso olhar para o passado. Garanhuns tem uma peculiaridade que poucas cidades do interior nordestino possuem, e talvez a que mais determine sua política diferenciada: a ausência de famílias “tradicionais’’ que, em grupos aliados ou opostos, exercem domínio político sobre o município. Essa é uma herança histórica diretamente influenciada pela “hecatombe de Garanhuns’’, que vitimou boa parte dos chefes políticos locais no início do século XX, ao ponto em que os sucessores foram, paulatinamente, sendo substituídos por “novatos’’ no exercício dos cargos eletivos, se verificando grande rotatividade no preenchimento destes.

Por outro lado, a promoção, durante os anos 60 e 70 do século XX, de uma política urbana e industrializante foi promovendo a transferência da população rural para a cidade, enfraquecendo proprietários de terras e contribuindo para que a divisão de terras no município se tornasse cada vez mais minifundiária, com o abandono das lavouras de café em prol da pecuária e da agricultura de subsistência. No fim do século, dois grupos políticos não oriundos de famílias tradicionais – um liderado pelo ex-prefeito Ivo Amaral e o outro pelo seu oponente, o então prefeito, Bartolomeu Quidute – espelhavam, na cidade, a rixa entre o PSB de Miguel Arraes e o PFL de Marco Maciel e Joaquim Francisco. Bartolomeu estava em vias de fazer o sucessor e contou com o massivo apoio de Arraes, então governador, para emplacar Silvino Duarte, nas históricas eleições de 1996, o que rendeu comentários, por parte do derrotado Ivo, de que “os precatórios de Arraes’’ estiveram por trás da vitória do Silvino.

É com tal eleição que, além da ausência de chefes e famílias tradicionais, verificando-se grande rotatividade de lideranças políticas precoces, rapidamente surgidas e rapidamente exauridas, se consolida outros dois pilares da estrutura política garanhuense: o apelo sem pudores à força econômica e o personalismo fraco. E não é segredo que a injeção robusta de recursos na campanha foi vital para a vitória de Silvino, que inaugurou uma forma de fazer política que já batizei, anteriormente, como “silvinismo’’.

Como Garanhuns, apesar de geralmente estar alheia às transformações do país, não deixa de seguir as ideologias da moda, tal época foi a do “neoliberalismo’’ na cidade. Com um forte ajuste fiscal, renegociação da dívida municipal e revisão de contratos, o novo governo saneou as contas públicas e constituiu uma reserva para, principalmente, investir em obras públicas de grande visibilidade, como a construção do “pop shop’’, o mercado popular da cidade, inaugurando uma espécie de "prefeitura mínima'' responsável somente pela área de infraestrutura, deixando a saúde e a educação "em mãos privadas''. Por outra via, praças, calçamentos e asfaltamentos foram executados por toda a cidade, garantindo ao prefeito o desfrute de significativa popularidade, o suficiente para garantir uma reeleição tranquila e o apoio de quase todos os vereadores. Estes, por sua vez, agiam como cabos eleitorais em tempo integral do prefeito, traficando pequenas vantagens e favores para suas bases eleitorais, como vagas de emprego, distribuição de cargos comissionados na Câmara ou na Prefeitura, consultas médicas, doação de remédios e internações hospitalares. Chamei tais práticas de "política pornográfica''. E assim o sistema tinha tudo para se reproduzir, e se reproduziu, com a eleição do herdeiro do “silvinismo’’, o prefeito Luiz Carlos de Oliveira.

Enquanto Silvino Duarte ganhou prêmios de gestão pública nacionais quando esta se resumia a cortar gastos e elevar impostos, deixando para o espontaneísmo do mercado a solução das graves desigualdades sociais (que se agravaram no município, com metade da população vivendo abaixo da linha da pobreza e parte desta na mais absoluta miséria, principalmente na empobrecida zona rural e nas periferias de formação caótica, formada por migrantes do campo ou de pequenas cidades que orbitam em torno de Garanhuns – que hoje tem papel vital na atual eleição, conforme se demonstrará) o Brasil mudou com a chegada do PT ao poder. Mas, dessa vez, Garanhuns não acompanhou o compasso.

A gestão Luiz Carlos seguiu as linhas deixadas pelo antecessor, embora tenham, conforme a tendência garanhuense oriunda do personalismo fraco de que os líderes políticos se sucedem rapidamente entre si (com um chefe político apoiando um sucessor e sendo por ele defenestrado, assumindo o último a chefia da cidade, até a próxima “traição’’), rompido posteriormente. Enquanto cidades como Arcoverde, Caruaru, Petrolina e Gravatá compreenderam que agora o governo federal adotara uma política de investimento na região nordeste, através de obras públicas de grande relevo, expansão da rede universitária federal, concessão de vantagens econômicas para a instalação de empresas de grande porte, programas sociais como o luz para todos e um grande volume de recursos através do PAC, o governo de Garanhuns continuou com uma política fechada, bairrista, cuidando meramente de calçar ruas em período pré-eleitoral, lotear a máquina pública e vender favores em troca de votos. E o bonde passou, o presidente Lula veio e se foi, e Garanhuns não viu uma única obra social de relevo, a não ser a instalação do campus da UFRPE, fruto direto da atuação de deputados como Fernando Ferro, que não contou com ajuda alguma por parte da prefeitura. Absolutamente nenhuma empresa de grande porte se instalou na cidade, que chegou ao ponto vergonhoso de ter menos de 10 estabelecimentos industriais (Caruaru, na mesma época, chegou a ter mais de 700!) e ter sido preterida por Bom Conselho para a instalação de grandes empreendimentos. Logo, viveria seguidas crises na agricultura e na pecuária, perdendo o posto de polo leiteiro para cidades próximas, sob as barbas da prefeitura, que permaneceu inerte diante do processo de “desindustrialização’’ e “abandono do campo’’.

Não bastasse a inércia, a gestão degringolou em irresponsabilidade fiscal. Os gastos superaram as receitas, o número de funcionários comissionados da prefeitura só aumentava (chegou-se ao pico de 3 mil, muito superior ao número de servidores públicos efetivos até hoje, tornando o município o maior empregador da cidade) e, por fim, vieram os escândalos. O que começou com o desvio de verbas públicas na reforma da ponte de um sítio – empenhada, liquidada e devidamente paga, mas jamais realizada – revelou sistemáticos desvios e fraudes a licitações públicas. Com as contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado, que delineou todos os desvios e violações legais cometidas pelo prefeito em fraudes nas licitações para a compra de material escolar e demais expedientes (uma breve lista: superfaturamento de obras, uso da máquina pública para promoção pessoal, pagamento de gratificações ilegais... a lista é grande!), a popularidade do gestor ficou no chão (com picos de rejeição batendo os 75%) e, depois de deixar o cargo, foi alvo de ação de improbidade administrativa que chegou a congelar seus bens, sendo ainda condenado a devolver quase R$ 700 mil aos cofres públicos.

Como agravante, o governo ainda adotou uma política bairrista, sendo incapaz de se articular com o governo do Estado e o governo Federal, tanto pela relação tempestuosa com o então deputado Izaias Régis, que representava a cidade na ALEPE, tanto pela ausência de canais políticos em Brasília. Garanhuns, pela fraqueza de lideranças, virou uma terra de ninguém, onde candidatos aventureiros fundavam comitês para arrancar dois, três ou quatro mil votos a cada quatro anos, esquecendo completamente a cidade entre um e outro mandato. Tal movimento chegou às raias do absurdo quando a candidata a deputada federal Ana Arraes, que nunca moveu um fio pela cidade, foi a mais votada nas eleições de 2010.

Diante da derrocada monumental do prefeito, o deputado Izaias Régis passou a liderar uma “oposição branca’’ contra o Executivo. A ideia era substituir a inércia de Luiz Carlos por uma gestão mais ativa, com muito “trabalho’’ e realizações concretas, trazendo desenvolvimento para a cidade. Aliás, durante toda sua carreira política, o deputado, aliado de Armando Monteiro – o grande nome dos industriais pernambucanos – prometeu “trazer indústrias’’ para a cidade, gerando emprego e renda. A ausência do cumprimento das principais promessas, contudo, não impediu que este lançasse a candidatura a prefeito, em 2012, sob forte clima de renovação política, para ocupar o vácuo da aparente queda do silvinismo, ainda mais como reação ao perigo de que Zé da Luz, ex-prefeito de Caetés, fizesse da cidade sua nova conquista política.

Silvino Duarte, antes candidato, retirou-se da disputa para apoiar Izaias, que venceu facilmente Zé da Luz e o candidato Paulo Camelo. Parecia o início de uma nova era, onde a ausência de chefes e famílias tradicionais, a efemeridade das lideranças políticas, os rompimentos constantes entre ex-aliados e inimigos mortais, o bairrismo e o assistencialismo pareciam com os dias contados.


2- "Abracadabra’’ e a ilusão da “grande gestão’’: a conjuntura de Garanhuns hoje

Sob fogos de artifício, o novo governo começou “cortando na carne’’. O corte de despesas foi significativo, contratos foram revistos e se pôs a casa em ordem. Com o equilíbrio fiscal voltando ao normal, após o primeiro ano de mandato foi iniciado uma série de ações e obras de pavimentação que, em grande parte, foram a marca da gestão Régis na prefeitura. Próximo ao senador Armando Monteiro, o governo municipal conseguiu a liberação de verbas há muito atrasadas, e viu aumentar o volume de transferências voluntárias por parte da União (dinheiro que, vindo do governo federal, não é de obrigatório repasse aos municípios, se tratando em grande parte de convênios com o ministério das cidades e emendas parlamentares ao orçamento federal). O dinheiro extra foi responsável por levar saneamento básico e calçamento à populações periféricas, principalmente das Cohabs, onde uma massa eleitoral esquecida que foi a principal arma de Zé da Luz contra Izaias em 2012.

Mas nada melhor que ouvir o próprio gestor fazer um balanço de seu governo. Em entrevista à TV Asa Branca, o prefeito Régis destacou a pavimentação de 432 ruas, enunciando que sua prioridade foi investir na periferia, bem como a substituição da iluminação pública da cidade por lâmpadas de LED. Ainda teria adotado uma visão empresarial na gestão da cidade, aumentando em “200%’’ a arrecadação do município e feito cortes necessários, como o fechamento do hospital municipal, onde “um parto custava cerca de R$ 330 mil’’ e feito um convênio com o hospital infantil para que realizasse os partos e promovesse a saúde da mulher. Destacou o concurso realizado para guardas municipais, alegou ter construído 6 creches e mais 3 postos de saúde, além de assegurar o pleno funcionamento das 35 unidades existentes. Por fim, alardeou ter realizado o “natal mais bonito do nordeste’’, o natal luz de 2015.

Dentre as realizações do prefeito, é inegável a boa gestão fiscal e sobretudo a política de transparência dos gastos públicos, sem dúvidas uma das melhores do país. É possível acompanhar o destino de cada centavo de dinheiro público manejado, bem como ter acesso a relatórios detalhados no site da Controladoria Municipal mantido em tempo real pela Prefeitura. Mas, em paralelo com o ensinamento bíblico, nem só de transparência vive o homem.

Como todo governo deve fazer escolhas e tomar decisões, deve igualmente fazer sacrifícios. No caso, o atual governo, que exerceu desde sempre uma boa gestão da Coisa Pública, conseguiu reduzir as despesas a ponto de ter uma boa margem para aplicar em investimentos (ou “despesas de capital’’, o tipo de gasto que pode gerar, no futuro, mais receita para a Administração ou que expande seu patrimônio, diferente das despesas correntes, do dia-a-dia, como o pagamento de funcionários) e tomou uma decisão sobre como aplicar o dinheiro. E tal decisão foi a de aplicar os recursos, prioritariamente, na infraestrutura da cidade.


A escolha trouxe benefícios, mas teve um custo.
Enquanto a cidade se tornava menos desestruturada, outras áreas, como a saúde e a educação, permaneceram subfinanciadas, com a estagnação dos postos de saúde (três foram construídos nestes 4 anos), que estão da raiz da crise de superlotação do Hospital Regional Dom Moura, para onde a maior parte da população se dirige em busca de remédios, exames simples e consultas básicas, devido à carência dos postos de saúde em prover tais demandas. A educação, embora bem gerida, não apresentou resultados expressivos ao não entregar, em 4 anos, nenhuma das creches em construção – o prefeito alega que “problemas da gestão anterior’’ levaram a cancelar a licitação, realizar uma nova e só assim dar seguimento às obras, que, seguindo tal lógica, já duram pelo menos 5 anos, sem falar que foram planejadas pela gestão anterior, e não pela atual, tornando nula a contribuição educacional do atual governo. Em que pese bons resultados do IDEB, houve crises constantes entre educadores e o governo, com a alteração do abono percebido pelos professores e até mesmo a decretação do estado de greve.

No que concerne aos servidores municipais, o município foi praticamente obrigado pelo Ministério Público a efetuar um concurso através de um Termo de Ajustamento de Conduta (um “puxão de orelha’’ para evitar que o MP proponha ação que obrigue o município a tal), com o fim de substituir o grande número de cargos comissionados por efetivos, em um processo longo, caótico e fiscalizado de perto pela instituição. Não fosse a atuação do MPPE, o exército de comissionados continuaria inalterado – embora, devido ao baixo número de vagas (pouco mais de 120), o grosso de comissionados continue a constituir o coração da administração municipal.

No geral, a prefeitura de Garanhuns foi como um estudante do ensino médio que tirou altas notas em matemática - mais teve desempenho pífio em histórica, português e geografia, as disciplinas que permitem refletir sobre o agir crítico do ser humano e seu papel histórico, essencialmente um agir projetado para o futuro. 


3- O futuro perdido?

A decisão por priorizar investimentos na área viária gerou consequências negativas ainda maiores, com o já citado fechamento do hospital municipal. O golpe maior foi a desistência, por parte da prefeitura, de realizar o Festival de Jazz municipal, evento de porte nacional que já havia se tornado patrimônio cultural da cidade. Alegou-se que, por gastos com o “Natal Luz’’, seria incabível realizar mais um evento festivo, embora não se tenha cessado os investimentos em calçamentos e asfaltamentos constantes. Ao custo de menos de R$ 1 milhão, o festival gerava muito mais em termos de renda, ocupação da rede hoteleira e fomento ao combalido setor comercial da cidade, e decidir pela sua não-realização foi um duro golpe na vocação turística do município. Enquanto isso, Gravatá abraçou o festival - e, atente-se, durante um período em que sofreu intervenção estadual por causa do altíssimo descontrole das contas públicas - e, nele vendo uma chance de ouro, o transformou em um sucesso.

Além do risco econômico causado pela perda do festival, o prefeito pecou pela não-realização de propostas vitais que o levaram ao poder. O fechamento do hospital municipal (que deveria se transformar em centro de saúde da mulher), o esquecimento sobre a construção de um laboratório de medicina do trabalho, a não aplicação de um programa de qualificação continuada para trabalhadores da saúde, a omissão na assistência odontológica e, principalmente, a omissão quanto à construção de um centro de diagnósticos em Garanhuns (com exames de raio-X, ultrassom etc., uma das maiores carências da cidade), revelam uma lista muito grande, e até inaceitável, de sacrifícios feitos para se manter um programa de obras públicas reconhecidamente eficiente. O pior, no entanto, para o governo foi fazer do saneamento e das obras básicas suas bandeiras políticas, mas ignorar o problema do acesso ao transporte público e da mobilidade em uma cidade que dobrou sua frota de carros na última década, efeito direto da adoção de uma das mais caras passagens, proporcionalmente, de ônibus do país.


E, em que pese afirmar estar construindo uma espécie de distrito industrial e “já estarem sendo gerados 70 empregos’’ e “algumas empresas já estarem se instalando’’ o sonho do desenvolvimento econômico nunca esteve mais distante. A cidade continua baseando sua economia no comércio com as cidades ao redor, omissa diante de uma seca que deixou de joelhos a zona rural e encareceu produtos básicos nas feiras dos bairros. Garanhuns vai perdendo sua grande vocação, de linha imanentemente agrícola – o solo da cidade é de grande fertilidade, bem como existem centenas de reservas de água em seu subsolo, prontas para irrigarem um novo ciclo do café e da pecuária – e abrindo mão de eventos que confirmam seu potencial turístico.

É uma cidade que vai perdendo as bases para um futuro de desenvolvimento econômico, ao sucatear a saúde, estagnar a educação, abandonar investimentos no campo e deixar de promover a cultura. Tanto é que o município não pretende realizar investimentos ou estimular a promoção de empreendimentos comerciais que, na Lei de Diretrizes Orçamentárias mais recente enviada pela Prefeitura, não se preveem renúncias fiscais ou incentivos fiscais para os próximos anos. Ou seja, sabe aquelas cidades que aplicaram a renúncia ou o incentivo fiscal para receber novos investimentos e cresceram? Garanhuns não é, e nem vai ser, como elas.

Destaque-se que, longe de aumentar a arrecadação em “200%’’, esta continua baixa e deixa a cidade dependente dos repasses do governo estadual e municipal, que vem minguando nos últimos anos. Já se prevê, para o ano que vem, um aumento no endividamento e nas despesas com a dívida municipal, como “ressaca’’ dos intensos gastos que foram realizados este ano. O risco é que a prefeitura mantenha o ritmo dos gastos enquanto as receitas enviadas por outras esferas de governo caiam, ou seja obrigada a reduzir tanto os gastos que fique incapaz de realizar investimentos. Ao invés de ter investido para criar as bases do futuro, a gestão Izaias investiu no presente, preferindo apresentar resultados de curto prazo para a população na forma de obras públicas, resgatando o silvinismo no sentido a usar a máquina pública para a promoção pessoal do administrador e fazer obras para “cativar’’ o eleitorado, usando como força motriz o exército de comissionados e clientes de líderes políticos aliados do poder municipal.

Em suma, o governo Izaias corre o risco de ser, como os últimos quatro governos, um governo de “tempo perdido’’, que desperdiçou chances históricas de desenvolver o município a partir de políticas públicas de longo prazo. O futuro da cidade, aquele ente perdido que leva muitos jovens a deixar o município em busca de oportunidades em outras terras, continua irrealizável.

E quando me perguntam que tipo de futuro me refiro, parece ser bem óbvio: uma velha teoria dizia que certos países e regiões produzem certos bens a custos menores que outros. A produção a custo menor se chama “vantagem comparativa’’, que simplificadamente significa “vocação natural’’. A de Garanhuns, surpreendentemente, abarca desde a agricultura até a indústria e o setor de serviços, por que além de terreno fértil, localização estratégica, presença de água e ser o centro econômico do agreste meridional (um mercado de pelo menos meio milhão de pessoas), a cidade possui o ativo mais valioso destes tempos globalizados: conhecimento. São três instituições de ensino superior, mais um campus do Instituto Federal de Garanhuns, todas bem avaliadas e renomadas, praticamente inutilizadas ou desintegradas da economia municipal, com alunos, professores e um potencial absurdo de projetos possíveis de serem aplicados na região, com reflexos na mecanização e massificação da agricultura, na construção de uma cooperativa pecuária que disponibilize a seus cooperados assistência técnica, na produção de softwares e empreendimentos na área de informação e tecnologia e, sobretudo, no investimento e valorização da educação de base, por parte de uma das maiores unidades da UPE no interior do Estado. Com tais pilares, fora os instrumentos jurídicos adequados (reforma do código tributário municipal para possibilitar uma tributação mais justa e eficiente, sem os abusos verificados na cobrança do IPTU e de contribuições de iluminação pública absurdamente altas, fora um planejamento urbano mais eficiente através da revisão do Plano diretor), estariam postos os fundamentos para um novo ciclo de desenvolvimento virtuoso, centralizado em Garanhuns, que teria condições de produzir políticos para, nacionalmente, continuar a trazer benefícios para a cidade. Atualmente, nenhum deputado estadual ou federal é de Garanhuns.

Não bastasse tais observações, a euforia em relação ao atual prefeito permite sacrificar o futuro em troca da ilusória promessa de permanência da atual situação. Como já se defendeu, os ciclos políticos de Garanhuns são curtos e terminam com os antigos chefes políticos sendo engolidos ou traídos pelas lideranças que eles mesmos alimentam, impedindo-se a formação de famílias ou chefes longamente influentes na cidade. Esta seria uma característica positiva se a cidade fosse politizada – o que, efetivamente, não é, imperando uma grande apatia quanto aos negócios públicos, pois estes se reduzem à mórbida gestão do presente.

Esta é uma cidade que prefere lançar sobre si mesma o feitiço do tempo e sacrificar o amanhã para dilatar o hoje. Por isso que não surpreende a possível vitória fácil do atual governo, cujas lantejoulas faíscam ilusões de uma vida melhor nas calçadas e praças, mas continuamente sofridas nos postos de saúde, escolas e no mercado de trabalho. Infelizmente, o atual prefeito não traz, entre suas propostas, nada que edifique o futuro da cidade, teimando em repetir o bordão de "fazer'' obras de infraestrutura como revitalizar praças e a entrada da cidade. Até nesse sentido, contudo, o atual gestor peca: nem mesmo o famoso "shopping center'' deixou de habitar a placa de anúncio onde está, bem na entrada da cidade, recepcionando os visitantes de Garanhuns como um símbolo sinistro de que, na terra de Simoa, o futuro sempre fica para o amanhã. 

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