sábado, 30 de junho de 2012

As eleições em Garanhuns- Pelo fim da política pornográfica



Como cidadão de Garanhuns, e que ama sua terra, resolvi me posicionar a respeito das eleições municipais, logo após a convenções que definiram as candidaturas. 

Garanhuns já foi uma das maiores economias de Pernambuco e do Nordeste, onde foi líder, na década de 1920, na produção café, exportado para a França. Após a crise de café, a cidade renasceu durante o auge do desenvolvimentismo no Brasil, com o governo de Souto Dourado, no início da década de 1960; indústrias se instalaram na região, onde grandes empreendimentos foram realizados, tendo por base uma sólida parceria com o governo estadual e federal. A Coca-Cola, a Parmalat e outras empresas ajudaram a dar um brilho especial à cidade, que chegou a ser um dos dez melhores municípios para se viver nos anos 1960, além do apresentar, também, um dos maiores índices de crescimento econômico. Mas os giros da política nacional e a ineficiência dos governos, nos últimos 20 anos, sepultaram as potencialidades da cidade e, ao fim, restaram à cidade poucas indústrias, um enorme índice de desemprego (mais de 25%), pobreza (que atingia 44% dos garanhuenses) e um crescimento econômico doente, sustentado pelo aumento dos gastos da prefeitura e pela especulação imobiliária.

Partindo desse cenário, as eleições municipais de Garanhuns são discutidas desde 2010. De lá para cá, dezenas de possibilidades foram discutidas, e até mesmo o nome do deputado federal Fernando Ferro foi especulado. Mas, infelizmente, depois de tanta discussão, o resultado foi bastante previsível: Izaias Régis (PTB), tendo como sustentáculo políticos o PT e o PSB, é o candidato do governador e, desde antes, já mostrou sua debilidade em construir alianças políticas com este, já que, mesmo sendo deputado estadual por dois mandatos, foi preterido, inicialmente, pela Frente Popular, que optou pelo nome de Antônio João Dourado, numa das consequências oriundas do afastamento entre Armando Monteiro e Eduardo Campos; Silvino Duarte, que driblou os impedimentos legais que obstavam sua candidatura, optou por aproximar-se de seu velho afilhado, o prefeito Luiz Carlos, e conta com o apoio do grosso dos vereadores, o que, por sua vez, significa a continuidade do projeto político atualmente no poder. Por fim, Zé da Luz, que, sem recursos ou aliados, aparenta disputar a prefeitura apenas com o intuito de pavimentar sua candidatura a deputado estadual, em 2014.

Sob esse ponto de vista, caminhamos para uma situação deplorável. O que se vê é uma ausência completa de projetos de governo e a presença de frágeis alianças partidárias com os níveis estadual e federal de governo. A maior prova deu-se durante a imposição da pré-candidatura de Antônio Dourado.

As necessidades e demandas do povo de Garanhuns foram os assuntos menos falados- antes, ignorados- no processo de formação das candidaturas, onde os conchavos políticos visaram, tão somente, de um lado, a permanência de uma casta política no poder (funcionários públicos, certos comerciantes e ruralistas) e, do outro, a subordinação da cidade aos planos presidenciais da Frente Popular (pelos quais até mesmo Jarbas Vasconcelos foi envolvido), de maneira totalmente auto-referente e desconectada da vida diária de Garanhuns. Em suma, a política garanhuense é a mera transposição de interesses pessoais para a esfera pública, numa verdadeira colonização do espaço de discussão política, que deveria tratar das necessidades coletivas, pela distribuição do "bolo'' de receitas gerado pelo esforço da sociedade. É, por isso, uma política pobre, miúda, criticada há mais de cem anos como "medieval'' por Joaquim Nabuco, e que, em um artigo veiculado na UPE, em 2010, denominei "política pornográfica''. Pornográfica, por que se assenta em relações promíscuas e condenáveis, onde o eleitor vende seu voto por quem lhe oferecer as maiores vantagens; mas há uma dupla prostituição, já que o candidato também "vende'' favores- algo semelhante ao famoso "tráfico de influência''-, tanto às empresas que financiam suas campanhas- as empreiteiras e concessionárias de sempre, em Garanhuns- e, também, comercializa sua imagem. Por outro lado, o mesmo político vende seu apoio a outros da mesma classe (ou seria casta?) em troca de benesses...

Essa relação social entre eleitor-eleito, assim, acaba solidificando-se a base das meras aparências, onde desejos materiais, individuais e imediatistas, de ambos são satisfeitos, remetendo ao significado original de porneé, que, em grego, referia-se às prostitutas baratas da Grécia Antiga, e graficus, que quer dizer "imagem, aparência'': imagens de prostituas baratas, possuídas por qualquer um, e altamente apelativas. Não há valores ou regras, apenas o fato de que quem tem mais, leva, mas sem toque, sem conjunção carnal; o que se vendem são imagens políticas, sem nenhuma substância, que são meras ilusões de possessão (o mesmo efeito da pornografia), que vislumbram e distraem quem as vê, proporcionando-lhes um rápido prazer. Nesse sentido, a política pornográfica, baseada em imagens (que é o que são as vantagens cedidas pelos políticos aos "eleitores'') promíscuas e apelativas, tem o condão de domesticar o eleitor (lembra do pannis et circenses?), que satisfaz seus desejos individuais, criando uma relação de dependência entre aquele que se exibe e vende sua imagem (o político) e aquele que dela se beneficia (o eleitor). Assim também são construídas as alianças políticas em Garanhuns, negociadas às alcovas, que utilizam como moeda de pagamento- e isso é o que é mais grave- a distribuição dos recursos e cargos públicos!!

A partir daí, das candidaturas apresentadas, a que mais causa incômodo é a de Silvino Duarte (ao lado, a casa dos horrores, formalmente chamada de "Câmara de Vereadores'', de Garanhuns). Apesar de seus tão propalados prêmios passados, onde foi apontado como um dos grandes gestores públicos do país, Silvino foi o articulador do modelo de governabilidade que vige em Garanhuns: amplas maiorias na Câmara, sustentada com o loteamento da máquina pública por pessoas da confiança dos vereadores ou de pessoas ligadas ao prefeito; condução de tímidas obras públicas, "para o povo ver'', desintegradas de qualquer projeto maior de desenvolvimento para a cidade; inatividade e quase total falta de integração com as outras esferas de governo, com o isolamento político da cidade; prosseguimento com a notória falta de investimento na educação e na saúde, sucateadas e duramente mantidas com parcos recursos, acompanhadas pelo corte severo de gastos sociais e, paradoxalmente, pelo aumento do custeio da máquina pública, a segunda maior empregadora do município, após o setor do comércio. O resultado desse modelo de gestão foi a estagnação da economia garanhuense em um período pré-Lula, onde a cidade assistiu ao Brasil e ao resto de Pernambuco, notadamente Caruaru, Arcoverde e Petrolina, darem um salto econômico qualitativo e quantitativo. 

Assim, as parcas vantagens oriundas dos serviços públicos são reservadas ao compadrio dos políticos, numa relação clientelista, por meio da qual se articulam bases eleitorais sólidas, mas totalmente anti-democráticas e excludentes; basta dizer que os pequenos favores, como marcação de consultas, doação de remédios, alimentos e mesmo de empregos (...) pelos políticos à segmentos reduzidos da população criaram um subsistema que drena os recursos públicos e, por outro lado, impede qualquer pressão popular por um governo desenvolvimentista. Quem não possui os contatos pessoais com os vereadores ou seus cabos eleitorais fica excluído da política, ora aceitando compra de seus votos, ora simplesmente ignorando os rumos que o município toma (ou deixa de tomar). Essas ligações de compadrio, "o subsistema de boas relações'', no jargão da antropologia, baseadas na amizade pessoal dos eleitores com os políticos, são o coração da estagnação da cidade: o sistema cria fortes fundamentos para manter-se, em estratos da própria população, em sua relação promiscua com a classe política, cujo auge de expressão se consagra no gravíssimo problema da histórica compra de votos em tempos de eleições; é um círculo vicioso, onde poucos eleitores e seus eleitos monopolizam a política municipal, excluindo o resto da população. Uma verdadeira oligarquia, em termos de ciência política, entre eleitores beneficiados pelos políticos, estando ambos voltados para a permanência do sistema, o que inibe qualquer formulação de um projeto de desenvolvimento, em um claro retorno ao sistema político vigente na República Velha (selecionar os eleitores e com eles manter uma relação promíscua foi a marca do período).

Ou seja, a política garanhuense se encontra em um estado pré-moderno, onde a gratidão aos políticos é o principal fator a influenciar os votos dos eleitores. Não se fala em ideias ou projetos, mas em vantagens a vender.

Não é preciso dizer que, para que Garanhuns avance no tempo, é preciso destruir esse sistema. Criar instituições sólidas, capazes de oferecer os servições públicos e gratuitos a toda a população, de forma isonômica, são o antídoto para erradicar esse câncer e isso se traduz em: reformar a Lei Orgânica, garantindo mais celeridade no processo legislativo, e introduzir mecanismos de participação popular (e o orçamento participativo seria uma ótima ideia), além de meios de contenção dos gastos com pessoal; elaboração de um Plano municipal de Educação a longo prazo, que implante o piso nacional salarial dos professores, instale a educação integral em conjunto com a qualificação técnica dos estudantes, bem como preveja convênios com a UPE e UFRPE para o uso do enorme potencial de seus alunos nas escolas integrais e como meios de erradicar o vergonhoso analfabetismo endêmico na região; reestruturar os postos de saúde, contratando novos profissionais, renegociando contratos e convênios mais vantajosos com as fornecedoras de medicamentos, sem esquecer de reestruturar o Hospital Municipal e flexibilizar o regime de contratação para médicos e enfermeiros; articulação maior com as esferas de governo estadual e federal, por meio da celebração de convênios para urgentes obras de infraestrutura (algo que Garanhuns raramente consegue, pela falta de projetos...), e com as demais prefeituras, no sentido de criar um bloco político regional para encaçapar mais deputados estaduais e federais; reformar as principais praças da cidade, dando-lhes um ar mais relacionado ao das cidades frias; realizar mais eventos populares, culturais e musicais, seja por meio de isenção fiscal a empresas ou grupo de empresas que o façam ou por convênios com o governo estadual; reestruturar ou criar novas cooperativas de agricultores e pecuaristas, lhes garantindo acesso ao PRONAF ou mesmo criando um programa municipal de aumento da produtividade e disposição de assistência técnica ao campo, por meio do uso do capital intelectual da UFRPE, na forma de seus alunos e, por fim, elaborar um novo Código tributário municipal, prevendo isenções fiscais para empresas que qualifiquem mão-de-obra, tenham ações educacionais, empreguem determinado número de pessoas ou realizem eventos culturais. Tudo isso, é claro, estruturado com o fim de consecução de metas nas diversas áreas (construção de 100 escolas, por exemplo; aumento do IDEB do município em dois pontos etc), em um projeto de longo prazo; qualificação, educação, assistência técnica, vantagens tributárias e parcerias com os demais entes federativos construiriam uma estrutura poderosa para a articulação de grandes empreendimentos privados na região, como as sonhadas indústrias e centros comerciais.

Enfim, seria o que eu cobraria de um candidato, para acabar de uma vez por todas com essa crise geral que prende Garanhuns há mais de 16 anos ao atraso. Não são sonhos impossíveis... um dia, Curitiba, no Paraná, e Campinas, ou mesmo Arcoverde, foram tão insignificantes quanto Garanhuns. E, através da superação de suas fraquezas, conseguiram se tornar modelos para a gestão municipal brasileira. Esta cidade pode  não só voltar a ser o que foi, mas voar muito mais alto: é hora de moralizar a política garanhuense com valores, e partir das imagens pornográficas da política para uma verdadeira relação substancial e estável entre o povo e o governo; em suma, os atuais (des)governantes devem permitir que o povo governe o que é dele, gerindo a Coisa Pública, e visar o bem da cidade, e não o dos próprios bolsos. Só nos resta, então, discutir, e esperar que dessa vez o tempo, para Garanhuns, volte a rodar. 

Um comentário:

  1. Posta mais coisas sobre Garanhuns, Jorge!
    Cara, seu texto tá muito bom... eu to um pouco desinformado, mas você ajudou muito! Garanhuns precisa de luz pra poder sair desse buraco!!!!!!!!!

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