Mais da metade dos Garanhuenses – aqueles com menos de 35 anos – não sabem o que é uma eleição sem que o deputado Izaias Régis esteja concorrendo a algum cargo. Mas quem é exatamente esse eterno candidato?
Antes das campanhas políticas, Izaías foi um cara comum. Estudou em colégio particular, mas iniciou cedo a vida como comerciante e comerciário, conseguindo inaugurar seu próprio negócio, uma loja de sapatos, no início dos anos 80. A ascensão de comerciário a empreendedor lhe valeu uma posição de destaque na Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), instituição à qual presidiu e se destacou pelas campanhas de vendas, sorteios e bingos.
Mas, como as atividades na CDL eram muito ligadas à política, não demorou para Izaías ser convencido a representar o povo.
O homem começou a se candidatar por volta de 1988, na época em que tinha a típica cabeleira oitentista e era um comerciante ascendente; teve 183 votos. Não teve sucesso/interesse nas eleições posteriores e, só em 1998, pleiteando uma vaga na ALEPE, conseguiria um resultado expressivo: 13.842 votos, vencendo, em Garanhuns, o ex-prefeito Ivo Amaral, mas sem levar o prêmio.
O resultado fez Izaias sonhar com a prefeitura pela primeira vez, em 2000, mas seus 11.801 votos não fizeram nem cócegas no prefeito Silvino Duarte. Silvino e Izaías voltariam a se enfrentar em 2002, quando o prefeito lançou sua esposa, Aurora Cristina, candidata a deputada estadual. Dessa vez, Régis levou a melhor, foi o mais votado em Garanhuns e conquistou a vaga, tendo o melhor resultado de sua vida, com 43.367 votos, enquanto a esposa do todo-poderoso de plantão não passou dos 26.479 votos. Foi fundamental o voto casado com o então deputado federal Armando Monteiro, o mentor de Régis, e a quem seguiu e seguiria pelo resto da vida.
Izaías inicia sua vida política, então, como inimigo jurado do prefeito Silvino, a quem acusou, repetidas vezes, de atos de corrupção. Eram frequentes os embates entre o então prefeito e o deputado, com acusações mútuas e panfletos anônimos sendo entregues nas casas, nos quais o deputado era acusado até de ter ameaçado um padre com uma suposta arma.
O fato é que Régis também não se deu muito bem com Luiz Carlos, o sucessor de Silvino, até fazerem as pazes na eleição de 2008, na qual a sombra de Zé da Luz ameaçou a cidade pela primeira vez. Firmemente aliado a “seu” Luiz, Izaias se consolidou como lugar-tenente de Armando Monteiro e surfou nas altas votações do patrono, agora senador da República, nas eleições de 2010.
Dois anos depois, Izaias começou a se estranhar com os aliados da Frente Popular de Eduardo Campos, já seguindo as tensões entre o governador e Armando. Dentre as várias controvérsias, estava a definição do nome de quem iria suceder o desgastado e impopular Luiz Carlos na prefeitura de Garanhuns: Eduardo queria Antônio João Dourado, ex-prefeito de Lajedo e nome de confiança histórico do PSB, enquanto Armando não poderia deixar de apoiar Izaias.
Foi assim que, novamente, Izaias e Luiz Carlos lideraram o movimento “prefeito de fora, Garanhuns não aceita!” que uniu todas as lideranças da cidade contra o movimento de Antônio João; aquilo deu uma injeção de adrenalina na moribunda gestão de “seu” Luiz, mas não recuperou sua impopularidade; qualquer candidato apoiado por ele não teria chance.
E foi assim que Izaias, enfrentando Eduardo, resolveu se candidatar a prefeito, tendo como adversários Zé da Luz, o forasteiro de Caetés, e o desafeto Silvino Duarte, além de Paulo Camelo, o homem das esquerdas.
Izaias iniciou sua campanha dizendo ter trazido o curso de Medicina para a cidade e enumerando seus feitos graças à parceria com Armando Monteiro. A coisa não deu certo e Silvino liderou as pesquisas, que começaram a apontar um crescimento da parte de Zé da Luz. Logo, ficou claro que Izaias e Silvino dividiam um mesmo eleitorado e que, separados, não venceriam o Zé.
Foi aí que uma das maiores reviravoltas políticas da história de Garanhuns teve lugar: Silvino, já cheio de processos e condenações, não conseguiu viabilizar a candidatura e desistiu dela para apoiar Izaias, com a benção tácita de Luiz Carlos. A vitória foi tranquila e Izaias, sob os fogos da renovação, fez a cidade entrar no que parecia ser uma nova era.
Não é necessário um aprofundamento sobre as gestões de Régis na prefeitura: sua melhor avaliação foi feita pelos eleitores que, em que pese tenham lhe dado vitórias históricas, também lhe mandaram recados que ele não soube escutar.
Izaias conseguiu recuperar as finanças da cidade, fez a máquina pública fazer o básico em termos de obras urbanas e cuidou dos aspectos mais materiais da gestão: conservação de praças, calçamentos, pavimentação. As pequenas obras estiveram por toda a cidade, embora tenha enfrentado greves na educação e tenha tomado decisões questionáveis sobre a Saúde, fechando o Hospital Municipal, se recusando a abrir a UPA 24h e mergulhando a cidade numa crise crônica de atendimento ambulatorial.
Esses problemas impediram que Izaias, um ex-deputado estadual de três mandatos consecutivos, conseguisse eleger Zaqueu Lins para sua antiga vaga, nas eleições de 2014. Desde aquela época, a votação obtida do Zaqueu consolidou a base política de Régis: cerca de 20 mil eleitores, que há 10 anos vem garantindo ao hoje deputado resiliência.
Quando ele próprio disputou sua reeleição, a ausência de adversários gerou um clima de já ganhou, mesmo após dois anos de rompimento com a Frente Popular de Pernambuco. Em 2016, Sivaldo Albino só veio a surgir como candidato na metade do ano e, mesmo que tenha tido o dobro de votos que o previsto, levou uma surra histórica de Régis, com 30 mil votos de frente.
O resultado consolidou a gestão de Izaias como universalmente bem aprovada e lhe fez terem ares de cacique partidário, mas também gerou um problema: fez o então prefeito se achar quase invencível. Nas eleições de 2018, Izaias não conseguiu emplacar o forasteiro Álvaro Porto como seu deputado oficial, perdendo feio para Sivaldo Albino por mais de 10 mil votos.
Dois anos depois, veio a pandemia e Izaias não lidou bem com a crise, visto que o município não tinha rede de urgência municipal e o prédio que deveria ser a UPA 24 h foi reformado, às pressas, para receber pacientes, ficando pronto já bem depois do pico pandêmico.
Tal ano também trouxe novas eleições e a vontade de Izaias era emplacar Haroldo, seu leal vice. Mas pesquisas internas e falas do próprio Haroldo (como a clássica “Garanhuns terá dois prefeitos”) o tiraram do jogo; Armando, que resolveu se aposentar do jogo político após a segunda derrota consecutiva em 2018, ungiu o deputado Fernando Rodolfo como líder da oposição ao PSB no agreste. Izaias, fielmente, seguiu a liderança de Rodolfo, que escolheu Silvino Duarte como candidato da situação em Garanhuns.
Como ambos nunca se bicaram – afinal, não dá pra esquecer as velhas ofensas dos anos 2000 – Izaias não se esforçou muito no apoio ao antigo rival, não fazendo muito para impedir a candidatura de Zaqueu.
Não se sabe se Izaias tinha ciência ou se foi pego de surpresa, mas Sivaldo Albino, que se candidatou com o apoio do PSB, venceu a eleição por uma penca de votos. As pesquisas davam como certa a vitória de Silvino e só este que vos fala – que eu lembre – acertou o resultado do pleito.
Certo ou errado, Silvino acusou Izaias de corpo-mole e rompeu com o antigo adversário, que se viu fora dos cargos públicos pela primeira vez em 18 anos. No entanto, Izaias continuou como lugar-tenente de Armando e recebeu a missão de liderar, em Garanhuns e região, a candidatura de Raquel Lyra ao governo estadual.
Sivaldo Albino já vinha de dois anos muito ruins de gestão e, para piorar, ainda lançou o filho para deputado estadual. A população não comprou e a eleição para deputado estadual, em 2022, se tornou o primeiro turno das eleições de 2024: Izaias venceu o grupo do prefeito na cidade por larga votação, graças à sua base de cerca de 20 mil votos.
Finalmente, a sorte parecia sorrir novamente para Régis, já que não só ele triunfou sobre seu maior adversário, como também Raquel foi eleita e ele, na qualidade de um de seus poucos quadros políticos confiáveis, estava destinado à grandes posições no futuro governo. Cargos foram especulados para Régis e fez-se muita especulação sobre quem ocuparia as posições-chaves do governo estadual na cidade, mas o que efetivamente aconteceu foi decepcionante.
Apesar de ser alçado ao posto de líder do governo na ALEPE, Izaias não teve a influência que esperava na nomeação de cargos foi paulatinamente perdendo influência, sendo pouco eficaz para evitar as derrotas cada vez maiores do governo Raquel em votações sensíveis. Régis, no entanto, só pensava em uma coisa: voltar à prefeitura, e transformou seu mandato numa crítica impiedosa e ininterrupta ao reinado dos Albino.
A confiança de Izaias em vencer as eleições desse ano vem de 2016, quando obteve a maior votação de sua vida, e de 2022, quando venceu o grupo do prefeito. Mas, em política, as coisas são como as nuvens, e o cenário desse ano mudou radicalmente. Isso, em parte, graças ao excesso de confiança de Régis, que confiou demais no próprio potencial eleitoral e deixou de articular uma chapa eleitoral competitiva, nem conseguiu mostrar algo de relevante como obra do governo estadual na cidade.
Hoje, depois de ter vencido o filho do prefeito nas eleições de 2022 em Garanhuns, Régis enfrenta um cenário de derrota antecipada. Sua chapa de vereadores não deve fazer mais que 3 ou 4 nomes e reduzirá o seu prestigio perante os altos escalões do governo estadual. Pesam contra ele as poucas ações em favor da cidade, a querela do FIG, a rejeição da governadora e o que considero seu pior defeito político: a falta de humildade. Acreditou o candidato que o atual prefeito tropeçaria nos próprios erros, mas não foi isso que aconteceu.
Mas Izaias, que é um político experiente, já caiu na real e sabe que não vencerá, por isso sua missão é a mais básica do reino da política animal: sobreviver. Ultrapassando 30% dos votos (o que é o seu teto, com 5 pontos para cima ou baixo) e conservando ou ampliando os 20 mil votos de 2022, o deputado conseguirá atravessar a tormenta para tentar renovar o mandato em 2026 e, assim, tentar voltar à prefeitura em 2028, já visando o fato de que Sivaldo não tem um sucessor natural (problema enfrentado por todos os governantes da cidade nos últimos 30 anos). Nenhuma dessas duas missões será possível com 18 mil votos ou menos: é como um carro que parte numa longa viagem sem combustível o bastante. Aliás, perdendo votos ante 2022, Izaias pode dar adeus à qualquer resquício de liderança do governo na ALEPE e aos poucos cargos que conseguiu abocanhar no governo estadual.
Izaias, para esta eleição, se apega a programas de governo passados, não fala em reativar o hospital municipal e se concentra ambas propostas de geração de empregos, empreenderismo, estadualizando novamente o FIG e até trazer o Motofest de novo para a cidade. Apesar do extenso programa de governo, muitas das propostas são apenas boas intenções genéricas.
Vale a pena citar, também, que Izaias responde por fraude à licitação (o antigo caso da padronização das bancas das feiras) e por doação de um terreno de forma ilegal (o caso da doação do terreno no Severiano Moraes para a Casa das Balas); em 2012, Izaias declarou ter R$ 733.743,78 em bens, incluindo casas, veículos e dois apartamentos no Recife. Neste ano, disse ter apenas um veículo no valor de R$ 160.000,00.
Apesar do extenso texto, podemos dizer que quem não conhecia o candidato pôde ter uma boa compreensão do homem. Comprometido e ao mesmo tempo meio relapso, fiel aos aliados e apaixonado, Izaias vai para a eleição mais difícil da sua vida, enfrentando a perspectiva de, talvez, encerrar sua carreira nas mãos de seu pior adversário.
E, em que pese seja um dos políticos responsáveis pelo subdesenvolvimento da cidade, pode-se dizer que Régis foi o que melhor tentou equilibrar o domínio das elites e caciques partidários com algum desenvolvimento. Pesa contra ele uma famigerada falta de humildade, que ele fez questão de destilar recentemente, ao dizer que tirou as pessoas "da lama".
Mas para onde irá o eterno candidato? O resultado do próximo domingo lhe dará mais dois anos ou o encaminhará para o cemitério político. Afinal, mesmo os guerreiros imortais dos filmes encontraram seu fim. E o de Régis, posso apostar, ainda está longe de chegar.
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