Tendo em vista fins didáticos, convenciona-se dividir os acontecimentos históricos em blocos abstratos, que por sua vez se inserem em classificações maiores e cada vez mais genéricas. Nosso objeto de discussão essa noite insere-se na história brasileira contemporânea com o epíteto de "Regime militar'', como designação do período compreendido entre 1964 e 1985. A verdade, porém, é que essas classificações não correspondem, por seu elevado nível de abstração, aos fatos. A história do Regime militar brasileiro começa, assim, muito antes do 1º de Abril de 1964.
Partindo dessa pequena constatação, sabemos que o Exército brasileiro era uma instituição moribunda até a Guerra do Paraguai, quando a reduzida Guarda Nacional (o instrumento militar de repressão criado pela Regência com o fim de esmagar as revoltas do pós-1831) não pôde fazer frente às hostes de Solano Lopes. O Império viu-se forçado a aumentar os investimentos no corpo militar, estruturando carreiras, estabelecendo subsídios duradores e equipando a nova força. A ideia era de que o Exército atuaria em caso de guerra ou agressão externa enquanto a Guarda Nacional teria funções de assegurar a ordem interna; contudo, o fim da guerra e o crescimento infraestrutural da instituição militar tornaram o Exército o único responsável pela ordem interna. Os oficiais pertenciam à nascente e reduzida classe média, excluída dos benefícios do boom econômico vivido pelo Brasil desde os anos 1850, que objetivava o estímulo à urbanização, proteção da indústria nacional e a adoção do trabalho livre.
2- O positivismo militarista
O Exército herda parte dessa pauta liberal, fundindo-a, contudo, com o positivismo francês pregado por Benjamin Constant e Quintino Bocaiúva; a defesa do trabalho livre contrastou de logo com a ideia de um Estado forte, ditatorial e centralizado, guia da industrialização nacional e promotor de grandes investimentos na educação (mediante uma reforma geral do ensino). Para os teóricos da Escola Superior de Guerra, a disciplina das Forças Armadas deveria ser estendida a toda a sociedade, destruindo, pela força, os latifúndios (mediante uma reforma agrária geral) e pela cientifização da política: só assim, o Brasil evoluiria do estado metafísico (segundo a classificação de A. Comte) para o Estado positivo, racional. A filosofia da história positivista, essencialmente baseada em uma trajetória linear de progresso, é aplicada ao Brasil, no sentido de que o Exército, reduto de pensadores e cientistas disciplinados e racionais, portadores da verdade revelada pela descrição objetiva e acrítica da realidade social, seria o condutor da sociedade brasileira rumo ao progresso. Progresso e razão que se incorporariam na República positiva, numa sociedade industrializada, marcada pelo domínio da ciência sobre as superstições arcaicas e anacronismos históricos, como a Monarquia.. Surge, assim, o primeiro pilar da futura ditadura militar: a associação da atuação das Forças Armadas com o próprio progresso e a ideia de que a hierarquia e disciplina militares devem ser estendidas à toda uma sociedade que, de forma caótica, se mantêm presa às superstições e ao atraso, emulando a luz da razão destruindo as trevas do obscurantismo. A construção de uma nação tornou-se, assim, um dos centros de gravitação do pensamento militar.
A concepção positivista, por outro lado, procura transplantar para a política e sociedade as mesmas regras observadas no estudo dos fenômenos da natureza: as partes componentes do corpo social devem funcionar em harmonia para que este sobreviva. Um corpo social que busca a sua destruição (daí o repúdio dos militares pelas ações revolucionárias) ou o fato de algum componente funcionar de maneira diversa e desintegrada do "todo'', autorizava o restante do corpo (as ditas "classes sociais'') a extirpá-lo da sociedade. Essa verdadeira ditadura do "bem-comum'', onde a sociedade esmaga o indivíduo, consistia na realização do Estado positivista e era o objetivo central dos militares do século XIX. Mais que isso, esse velho ranço positivista iria servir de suporte a aplicação da Doutrina de Segurança Nacional no Brasil.
2- O positivismo militarista
A concepção positivista, por outro lado, procura transplantar para a política e sociedade as mesmas regras observadas no estudo dos fenômenos da natureza: as partes componentes do corpo social devem funcionar em harmonia para que este sobreviva. Um corpo social que busca a sua destruição (daí o repúdio dos militares pelas ações revolucionárias) ou o fato de algum componente funcionar de maneira diversa e desintegrada do "todo'', autorizava o restante do corpo (as ditas "classes sociais'') a extirpá-lo da sociedade. Essa verdadeira ditadura do "bem-comum'', onde a sociedade esmaga o indivíduo, consistia na realização do Estado positivista e era o objetivo central dos militares do século XIX. Mais que isso, esse velho ranço positivista iria servir de suporte a aplicação da Doutrina de Segurança Nacional no Brasil.
3- A República da Espada e a primeira experiência de governo militar brasileira
Poucos podem lembrar, mas houve mais de uma ditadura militar. Como dito, estruturado pelo próprio Estado imperial, mas composto de elementos originários da classe média (e sob uma ideia geral de progresso em carreira pelo mérito, e não pelo nascimento), o Exército desenvolveu ideias frontalmente contrárias aos interesses das elites monarquistas. As novas burguesias paulistas, cafeicultoras, necessitavam de uma infrastrutura industrial, fiscal e política para ampliar seus negócios e, em parte, seus interesses coincidiram com os da classe militar. Tento que, juntos, derrubam a Monarquia e fundam uma aparente República liberal e federalista. Não se impediu, contudo, que os militares, no governo, pusessem em prática suas ideias industrialistas (que redundaram em um enorme fracasso, o "encilhamento''), causando um racha na coalizão republicana e pondo em risco o regime federalista criado. Abriu-se tamanha crise política que a Marinha revoltou-se, bombardeando o Rio de Janeiro, junto com parte das tropas estacionadas no Rio Grande do Sul, defensoras do federalismo. Ante à crise, o incompetente Marechal Deodoro renuncia e seu vice, Floriano Peixoto, também Marechal, assume o poder como presidente da República. Frio, calculista e cruel, o Marechal de ferro tomou medidas politicas populares (congelou o preço dos alimentos, por exemplo), apoiou os candidatos das oligarquias e aprovou, sob o Estado de Sítio, inúmeros projetos de isenção fiscal e incentivo para a produção de café.
A oligarquia, vendo as massas disciplinadas pelas medidas populistas de Peixoto e sendo por ele beneficiada, ainda apoiou Floriano naquilo que, na verdade, era o principal interesse dos coronéis do café: estabilizar a República, propiciando a chegada de investimentos externos e o aumento da produção. O resultado foi uma verdadeira ditadura, que durou três anos, onde milhares de pessoas foram executadas, presas ou exiladas, e as revoltas foram esmagadas (a revolta federalista, que uniu republicanos dissidentes, monarquistas e membros rebeldes da Marinha, como Custódio de Melo e Saldanha da Gama, lutou contra os centralistas apoiadores da ditadura de Floriano, reunidos em torno de Júlio de Castilhos. Foi este homem, defensor convicto do centralismo, quem iria, posteriormente, difundir novas ideias que estruturaram a doutrina de Segurança Nacional e a ditadura de Getúlio Vargas). Após o banho de sangue, comandados por homens como o coronel Júlio César (o "corta-cabeças''...), Floriano apoiou o representante das oligarquias ao Palácio do Catete, cumprindo o acordo firmado com estas. Assim, surge o segundo pilar da ditadura militar: a associação com os grandes poderes econômicos, sempre alvo da proteção militar (a ideia das Forças Armadas como garantidoras de uma ordem; uma ordem estabelecida pelo poder econômico; uma ordem, sobretudo, racional, fundada no domínio metodológico da natureza pela ciência, vista como a causa do progresso social e da melhoria do bem-estar da humanidade). Afastado do poder, o Exército assume a postura de verdadeiro Quarto Poder, garantindo o equilíbrio dos demais, intervindo quando necessário para preservar a ordem (agrarista, excludente, estamental).
4- O tenentismo e a fase heroica do militarismo brasileiro
A aliança militar com os latifundiários sofre graves revezes a partir da década de 1920. A substituição das gerações de militares foi inevitável e os novos oficiais, de média e baixa patente, absorveram as ideias mais progressistas da Academia Militar, retomando a ideia de um regime centralizado, indutor da indústria, do urbanismo e da educação. Basicamente, o nacionalismo militarista foi combinado às demandas da classe média pelo voto secreto e universal, pilares de uma verdadeira democracia. Costuma-se, então, dizer que o chamado tenentismo, movimento militar nascido dessas frustrações, é a corporificação das demandas da classe média e, vale dizer, seu braço armado. Os primeiros conflitos surgiram com a fraude eleitoral que levou Artur Bernardes à presidência da República contra Nilo Peçanha, o candidato das classes medias, populares e militares: 18 militares marcham contra o Palácio do Catete e apenas dois (Eduardo Gomes e Siqueira Campos) sobrevivem, após o confronto com a polícia, ascendendo a chama da revolta em São Paulo, o coração geográfico das oligarquias. O General Isidoro Dias lidera uma grande revolta na própria metrópole paulista e seus comandados se unem à coluna Miguel Costa- Prestes, iniciando uma grande aventura militar buscando derrubar as oligarquias levantando a população do campo contra as cidades. O heroico movimento terminou dissolvido, mas sem jamais ter perdido uma batalha e ter causado sérios danos às forças fieis ao regime oligárquico. Os tenentes, perseguidos pelo governo Washington Luís, voltaram à cena política quando o pacto das oligarquias foi rompido ante à crise econômica mundial, capitaneando a Revolução de 1930, maior feito político no Brasil do século XX.
Aqui se dá uma fase diversa da evolução das Forças Armadas, rachadas, pela primeira vez, entre o velho oficialato positivista, agregado às decadentes oligarquias, e os tenentes, legítimos representantes das demandas da classe média. O fim dessa cisão, porém, deu-se em uma nova unificação das Forças Armadas, cerradas, agora, em defesa da ordem e, posteriormente, da ditadura do Estado Novo. O razão dessa união deu-se por dois motivos: a substituição natural dos velhos comandantes pela nova safra tenentista e a ascensão dos mesmos tenentes ao poder, como interventores federais, além da realização, num primeiro momento, da pauta política (que traduziu-se em uma reforma política, com eleições secretas e voto universal), fator que alijou os tenentes de uma ordem ideológica em comum. Esse vácuo, aumentado pela gradual exclusão dos tenentes do poder, acabou por aproximar o Exército de tendências políticas extremistas, como o fascismo, em voga na Europa, e, em menor escala, o comunismo, triunfando, como já referido, a tendência legalista, defensora da manutenção da ordem sem oscilar para nenhum desses extremos. É em torno dessa ideia que se unem os velhos tenentes e remanescentes do velho Exército, que se convertem em sustentáculo do Estado Novo getulista.
5- O Estado Novo: os tenentes no poder
5- O Estado Novo: os tenentes no poder
Pode-se dizer que o Estado Novo é a realização do velho sonho tenentista. Aqui, os militares, ao lado de Getúlio Vargas, de setores das classes médias, do capital industrial nacional e mesmo os trabalhadores urbanos, numa complexa coalizão de forças políticas divergentes, engendraram um projeto nacionalista, reformando o Estado (criando-se uma verdadeira burocracia obediente aos comandos legais, rompendo com o marcante patrimonialismo reinante desde os tempos coloniais), estimulando a indústria de base (que lançou as bases e catapultou o posterior boom econômico do modelo "juscelinista'', levado ao auge pelos militares no início dos anos 70) e lançando uma série de direitos sociais (trabalhistas, previdenciários, civis e comerciais), muitos dos quais vigentes ainda hoje. Promoveu-se uma verdadeira quebra parcial com o modelo oligárquico, com a reforma social, efetuada de cima (do Estado) para baixo (sociedade), remodelando a infraestrutura política e jurídica para permitir o avanço da nascente infraestrutura industrial.
O modelo de Estado fundado por Vargas e pelos militares constitui a célula-base de organização das instituições estatais ainda hoje, e, posteriormente, seria esse projeto nacionalista o pilar estruturante, pelo menos ideologicamente, do futuro Regime Militar, filho póstumo do tenentismo e, indiretamente, da própria Revolução de 1930. Aqui, por sua vez, defende-se que houve, durante mais de 150 anos, um projeto nacional dos militares para o Brasil estruturado no velho positivismo e numa filosofia da história etapista e baseada na ideia de progresso; trata-sede um projeto emendado ao longo do tempo, mas basicamente assentado na aspiração a um Estado antidemocrático, centralista (e anti-federativo, diga-se) e nacionalista, ao industrialismo (decorrente da noção baconiana de dominação da natureza pelo saber empírico) e, sobretudo, na defesa de uma ordem social estável.
Paradoxalmente, após o reaparelhamento das Forças Armadas em virtude da pequena participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, foram os próprios militares que derrubaram o Estado Novo elaborado por eles mesmos. Isso se deve ao fato de que, novamente associados ao grande poder econômico, o Exército entendeu que, para preservar a ordem e alcançar o progresso (lema que os militares estamparam na bandeira nacional), era necessário depor Vargas e convocar eleições, escondendo o objetivo secreto de, pela via eleitoral, assegurar o controle absoluto do Estado pelas novas elites econômicas, obstadas pelas "perigosas'' políticas trabalhistas de Vargas.
6- A redemocratização e a "democracia tutelada''
6- A redemocratização e a "democracia tutelada''
Foi nesse contexto, durante a participação do brasil na Segunda Guerra, que os oficiais brasileiros se aproximaram do Exército norte-americano. Aos poucos, centenas de oficiais foram enviados aos EUA para aprender as táticas militares, modos de organização e absorver a ideologia militarista que consagrava a Teoria da Segurança Nacional, já no contexto da guerra fria. Essa aproximação entre os militares de ambos os países foi a última peça a completar o quadro ideológico das Forças Armadas nacionais e desempenharia papel vital durante a Ditadura Militar. Por sua vez, pragmaticamente, interessava ao Exército a assessoria militar americana, armamentos e técnicas de treinamento americanos. Por sua vez, os militares aceitaram sua posição como subordinados dos EUA na luta contra o comunismo.
Novamente, os militares, na regime democrático de 1946, se recolhem ao posto de guardas da ordem, sem, contudo, abrir mão de uma assídua intervenção na política, lançando inúmeros candidatos à Câmara, Senado, governos estaduais, prefeituras, Assembleías e vereaturas, como Eduardo Gomes, Juarez Távora, Eurico Gaspar Dutra e e outros. No contexto internacional, a guerra fria ganhava corpo e, dentro do país, os pólos políticos se articularam entre pró-getulistas (e, diga-se, verdadeiramente nacionalistas), enquadrados no PSD e PTB (fundados por Getúlio), e os liberais e pró-EUA, capitaneados pela UDN, PNC e, infelizmente, pela maioria dos militares, que buscavam preservar a ordem capitalista mais que integrar a economia brasileira aos EUA, fato estranho a sua ideologia, como já visto. Tratou-se de uma aliança meramente estratégica, cujo vínculo comum se resumia ao combate ao comunismo, ao trabalhismo e às mudanças abruptas da ordem política e social. Uma ala importante das Forças Armadas, contudo, aderiu novamente a Getúlio Vargas quando de sua volta ao poder, retomando os ideais mais próximos do tenentismo dos tempos dourados, acrescido da defesa da democracia e da legalidade. A figura central desse ressurgimento foi Henrique Teixeira Lott, Marechal que se destacou em defesa da legalidade fundada pela vacilante Constituição de 1946, cuja atuação foi de encontro ao restante da cúpula militar, resultando no princípio do futuro racha entre "linha dura'' e "linha branda'', durante os primeiros anos do ditadura militar.
Getúlio e a cúpula militar, durante o Estado Novo
7- A Doutrina de Segurança Nacional: a alma do Regime Militar
A postura das Forças Armadas foi essencialmente antidemocrática, identificando qualquer avanço político e econômico como um passo em direção ao comunismo. Nessa época, a Escola Superior de Guerra, partindo da inspiração norte-americana já citada, importa dos EUA e adapta ao Brasil a Doutrina de Segurança Nacional, que consolida mais de 100 anos de filosofia militar e lança as diretrizes da atuação do Exército daí em diante, consistindo na "alma'' do Estado surgido após o 1º de abril de 1964. Parte tal teoria do pressuposto da permanente ameaça, representada pelo comunismo interno e externo, às instituições nacionais (a família, propriedade privada e economia de mercado), que justificam uma hipertrofia do Exército e uma vigilância anormal do Estado sobre a sociedade. Os inimigos estão em todas as esquinas, ruas e praças, disfarçados como cidadãos comuns, e, pior, estão infiltrados no Estado e no próprio Exército. Por outro lado, essa presença de inimigos (que desejam perverter a ordem social, através do exame crítico da sociedade), traz a necessidade de construir um Estado grande e forte, que promova o desenvolvimento econômico em setores chave da economia, com o fim de que, em uma eventual guerra, o país possa dispor de todos os recursos (principalmente industriais) para enfrentar seus adversários.
Por outro lado, o grande inimigo é inimigo interno, sendo tal conceito extremamente vago e indefinido justamente para permitir que nele se enquadrem quaisquer forças políticas progressistas. Por outro lado, admite-se que os inimigos internos de uma nação podem não se localizarem nela, mas ainda assim estarem dentro da chamada "fronteira ideológica'' (o âmbito de ação de um governo militar se estende tanto quanto for necessário ao cumprimento dos objetivos nacionais), pela qual se fundamentaria a cooperação entre diversos países contra os inimigos em comum (tal ideia acabou legitimando a "Operação Condor''), e mesmo a intervenção militar em outro país (fundamento político das invasões norte-americanas a países centrais da América). A única instituição investida da missão de vigiar a sociedade, extirpando delas os subversivos comunistas, defendendo os valores ocidentais e cristãos, e capaz de conduzir o desenvolvimento econômico, única garantia de segurança do país e, sobretudo, pilar de sua soberania, seria o próprio Exército; muito além dos esquerdistas ou direitistas, os militares fariam triunfar sobre as ambições destes os interesses da pátria. Daí legitimar-se a derrubada do próprio Estado (e da própria democracia) pelas Forças Armadas.
Essa nova teoria, como visto, não passa de uma adaptação da Doutrina original norte-americana, mas fundamentada, nacionalmente, no velho positivismo totalitarista (descrito no início do post).
7- A Doutrina de Segurança Nacional: a alma do Regime Militar
A postura das Forças Armadas foi essencialmente antidemocrática, identificando qualquer avanço político e econômico como um passo em direção ao comunismo. Nessa época, a Escola Superior de Guerra, partindo da inspiração norte-americana já citada, importa dos EUA e adapta ao Brasil a Doutrina de Segurança Nacional, que consolida mais de 100 anos de filosofia militar e lança as diretrizes da atuação do Exército daí em diante, consistindo na "alma'' do Estado surgido após o 1º de abril de 1964. Parte tal teoria do pressuposto da permanente ameaça, representada pelo comunismo interno e externo, às instituições nacionais (a família, propriedade privada e economia de mercado), que justificam uma hipertrofia do Exército e uma vigilância anormal do Estado sobre a sociedade. Os inimigos estão em todas as esquinas, ruas e praças, disfarçados como cidadãos comuns, e, pior, estão infiltrados no Estado e no próprio Exército. Por outro lado, essa presença de inimigos (que desejam perverter a ordem social, através do exame crítico da sociedade), traz a necessidade de construir um Estado grande e forte, que promova o desenvolvimento econômico em setores chave da economia, com o fim de que, em uma eventual guerra, o país possa dispor de todos os recursos (principalmente industriais) para enfrentar seus adversários.
Por outro lado, o grande inimigo é inimigo interno, sendo tal conceito extremamente vago e indefinido justamente para permitir que nele se enquadrem quaisquer forças políticas progressistas. Por outro lado, admite-se que os inimigos internos de uma nação podem não se localizarem nela, mas ainda assim estarem dentro da chamada "fronteira ideológica'' (o âmbito de ação de um governo militar se estende tanto quanto for necessário ao cumprimento dos objetivos nacionais), pela qual se fundamentaria a cooperação entre diversos países contra os inimigos em comum (tal ideia acabou legitimando a "Operação Condor''), e mesmo a intervenção militar em outro país (fundamento político das invasões norte-americanas a países centrais da América). A única instituição investida da missão de vigiar a sociedade, extirpando delas os subversivos comunistas, defendendo os valores ocidentais e cristãos, e capaz de conduzir o desenvolvimento econômico, única garantia de segurança do país e, sobretudo, pilar de sua soberania, seria o próprio Exército; muito além dos esquerdistas ou direitistas, os militares fariam triunfar sobre as ambições destes os interesses da pátria. Daí legitimar-se a derrubada do próprio Estado (e da própria democracia) pelas Forças Armadas.
Essa nova teoria, como visto, não passa de uma adaptação da Doutrina original norte-americana, mas fundamentada, nacionalmente, no velho positivismo totalitarista (descrito no início do post).
8- O modelo econômico juscelinista: nacional-desenvolvimentismo
Além do cenário internacional impropício, a política
interna brasileira radicalizou-se com as medidas nacionalistas de Vargas, que passou a ser alvo de uma campanha imoral de difamação pela imprensa. A UDN, tendo como longa manus a Aeronáutica, arquitetou um golpe de Estado, com a chancela dos comandantes do Exército e Marinha. Contudo, o suicídio de Vargas e a ação rápida de Lott, posteriormente, em assegurar a posse de Juscelino Kubitischek (candidato apoiado por Getúlio) inviabilizaram as pretensões golpistas. Dois golpes militares foram evitados, um por Vargas e o outro, por Lott.
interna brasileira radicalizou-se com as medidas nacionalistas de Vargas, que passou a ser alvo de uma campanha imoral de difamação pela imprensa. A UDN, tendo como longa manus a Aeronáutica, arquitetou um golpe de Estado, com a chancela dos comandantes do Exército e Marinha. Contudo, o suicídio de Vargas e a ação rápida de Lott, posteriormente, em assegurar a posse de Juscelino Kubitischek (candidato apoiado por Getúlio) inviabilizaram as pretensões golpistas. Dois golpes militares foram evitados, um por Vargas e o outro, por Lott.
Paradoxalmente o Exército ter se oposto, inicialmente, a JK, o último ponto a estruturar a futura ditadura foi o modelo econômico forjado nos anos dourados em que Juscelino governou o Brasil, embasado na parceira entre Estado e capital internacional, assumindo o primeiro a tarefa de oferecer toda uma infraestrutura ao último, dos quais se distinguem os seguintes pontos:
- Provimento de grandes obras públicas, como rodovias, hidrelétricas, resultando em vetores de escoamento da produção, energia elétrica em abundância. Aqui, o Estado atua diretamente na economia, induzindo o aumento do PIB mediante o aumento de seus gastos, resultando em um efeito multiplicador do PIB ( G aumenta, I, de investimentos, também, e, por sua vez, a renda Y segue o aumento proporcionalmente, resultando em maior renda disponível para o consumo);
- Adoção de uma política monetária expansionista, baseada na redução dos juros, induzindo o consumo e desvalorizando o câmbio, estimulando assim as exportações e encarecendo as importações. Garante-se, assim, que mais divisas entrem no país que saiam, numa aplicação direta da Doutrina de Segurança Nacional à economia: mais riquezas dentro do país e menos fora dele;
- Concessão de inúmeros benefícios fiscais ao grande capital internacional, e disponibilização de crédito barato para os agentes econômicos investirem na economia.
- Investimento na área social, com qualificação da mão-de-obra e criação de agências de fomento para regiões carentes do país (como a SUDENE) e melhoria do ensino em todos os níveis;
-Aumento real dos salários, para induzir o consumo.
-Aumento real dos salários, para induzir o consumo.
Tais políticas consistem no chamado "desenvolvimentismo'', aplicação das doutrinas keynesianas aos países do então terceiro mundo. O objetivo claramente se era derrubar os custos de produção no Brasil e, por meio do aumento da margem de lucro, atrair grandes empresas estrangerias para o país, fato que ocorreu. O grande problema deu-se com a expansão excessiva dos gastos públicos, resultando na explosão do endividamento externo e, por outro lado, as políticas distributivas de Juscelino (efetuadas através dos aumentos seguidos do salário mínimo), combinadas com a excessiva liquidez do mercado (o dinheiro "barato'', com o aumento da demanda) derrubaram o poder de compra da moeda, gerando uma grande inflação de demanda. Ocorre que, gastando demais, o governo aumenta a demanda por certos bens essenciais, cuja produção não acompanha o aumento da procura; por outro lado, com mais demanda em geral, tem-se mais investimentos, resultando em mais empregos, mais consumo e, por sua vez, maior aumento da demanda e dos preços, já que o consumo cresceu muito ais rápido que a demanda. O aumento salarial, muitas vezes atrasado em recompor as perdas sofridas pela inflação, só faziam aprofundá-la. Os juros subiram para conter a inflação, contrastando com o aumento geométrico dos gastos do governo. O problema reside no fato de que o surto desenvolvimentista deu-se rápido demais, sem contar com uma estrutura econômica que lhe permitisse uma expansão continuada.
A inflação gerou redução dos salários e lucros, opondo trabalhadores e capitalistas, cada um defendendo o aumento de um e outro, respectivamente. O governo viu-se em grande dificuldades: aumentar os lucros só seria possível reduzindo salários, cortando os gastos do Estado e aumentando os juros, induzindo uma recessão certa. Aumentar os salários faria a inflação disparar e os lucros caírem, apesar de elevar o crescimento econômico, as receitas do Estado e a própria produtividade. Esse fogo cruzado, verdadeira luta de classes, opôs a coalizão nacionalista e os udenistas, contraposição que refletiu em diversas regiões do país em conflitos conexos, gerando uma intensa polarização social.
No campo, os latifundiários enfrentaram camponeses e suas pretensões de reforma agrária, gerando o pior conflito fundiário da história do pais, capitaneado pelas Ligas Camponesas. Militares de baixa patente se insubordinaram, pedindo melhorias das condições de trabalho; dentro da Igreja Católica, padres progressistas desafiaram o clero ultraconservador; trabalhadores promoveram gigantescas greves, às centenas, todos os anos, por aumentos salariais e concessão de benefícios trabalhistas; a imprensa atacava o imobilismo do governo, financiada pelo governo dos EUA, que, por sua vez, travava uma luta ideológica com a URSS, dentro das fronteiras nacionais, apoiando grupos de extrema direita (bancando campanhas de políticos hostis ao governo, comprando parlamentares em votações importantes, oferecendo bolsas de estudo nos EUA...); tal ação deu-se através do IBAD e do IPES, institutos divulgadores da Doutrina de Segurança Nacional. A desorganização favoreceu a desordem e o aumento de criminalidade, principalmente quanto à ilícitos contra o sistema financeiro, fraudes no faturamento de grandes empresas, remessas de lucros ao exterior falsificadas, subemprego...
9- A desorganização política brasileira e o governo Goulart
Trata-se, em suma, da explosão das contradições do modelo juscelinista de Estado e de sociedade, e da ameaça de transformação da sociedade para rumos mais autonomistas em relação aos EUA, o que era encarado como um passo em direção ao comunismo. Como o Brasil, enquanto maior economia da América latina, provavelmente arrastaria o resto do continente para onde quer que fosse politicamente, os EUA trataram de evitar isso a todo custo. Daí as instituições fundadas pela embaixada americana- o IPES e o IBAD- serem o centro nervoso de articulação de todos os setores reacionários, liberais e mesmo fascistas que faziam oposição a Jango.
Jânio Quadros já renunciara (fato que despertaria uma profunda crise política, em que o parlamentarismo foi a solução para manter a legalidade) e um novo golpe, visando impedir a posse do vice, João Goulart, estava em curso; foi frustrado pela ação de Brizola, governador do Rio Grande do Sul, e de Lott, comandante da ala legalista das Forças Armadas. Jango assume o poder, inicialmente limitado pelo parlamentarismo, ao qual consegue derrotar por meio de um plebiscito que restaurou o presidencialismo. Os conflitos sociais e a oscilação entre uma política econômica favorável aos trabalhadores e medidas ortodoxas requeridas pelo empresariado minaram o governo, atacado por todas as frentes.
Diante do aumento de conflito, infundiu-se a ideia de que o país mergulhara no caos por causa da incompetência do governo Goulart em administrar a situação. Fazendo concessões a um grupo político qualquer, mas acariciando os grupos inimigos, Jango conseguiu despertar a fúria da direita- mediante seu projeto de reformas de base- além de pulverizar sua base de apoio -o PSD, o PCB e o PTB- com sua relutância, falta de articulação política e de "atitude''; suas concessões aos movimentos populares e sua inércia em travar certas lutas lhe ocasionaram a perda de apoio político. Isso, pelo menos, era o que se propagava, através dos jornais Folha de São Paulo e O Globo.
O cenário de caos total criado pela mídia, com o apoio dos EUA (a partir de Lincoln Gordon, seu embaixador) legitimou a ação do Exército. Na verdade, os problemas se resumiam a incapacidade do Governo de administrar os graves conflitos sociais inexistentes; Jango tentava equilibrar-se entre a direita e a esquerda. No fim, o governo cometeu o sério erro de radicalizar suas posições nacionalistas em um momento deveras delicado de crise econômica e social: o anúncio das reformas de base (dentre elas, a agrária e bancária, que insurgiram os poderosos coronéis rurais e os banqueiros contra o governo) levou a classe média - a mesma da qual são originários os militares- às ruas, pedindo a derrocada do governo sob os fuzis dos guardiões da pátria, dando raízes sociais legitimantes das pretensões golpistas do Exército. O fatídico episódio da anistia aos participantes do motim dos marinheiros por Goulart serviu de gatilho para a detonação do golpe militar, em 1964. Nesse momento, mesmo o PSD, partido-chave e sustentáculo de Goulart, o abandonou, enquanto que a esquerda em geral, demandante de medidas mais radical, não apoiou o presidente quando do anúncio das reformas.
A ideia básica era de que as reformas representavam uma séria agressão aos valores tradicionais do país e uma verdadeira instalação de um regime esquerdista, financiado por Fidel Castro e pela URSS, através do PCB, liderado pelo ex-tenente Luis Carlos Prestes. A democracia estaria ameaçada, pela revolta de um dos componentes do corpo social (o Estado) contra a própria sociedade. Estava em cheque a própria segurança da nação.
Era preciso agir.
A ideia básica era de que as reformas representavam uma séria agressão aos valores tradicionais do país e uma verdadeira instalação de um regime esquerdista, financiado por Fidel Castro e pela URSS, através do PCB, liderado pelo ex-tenente Luis Carlos Prestes. A democracia estaria ameaçada, pela revolta de um dos componentes do corpo social (o Estado) contra a própria sociedade. Estava em cheque a própria segurança da nação.
Era preciso agir.
Nessa data, lideranças civis e militares de direita, cerradas em torno de um ideal em comum- derrubar Goulart e realizar as reformas necessárias para superar as crises do capitalismo brasileiro- derrotaram a esquerda dividida por conflitos internos e divergências ideológicas (o racha entre PCB e PC do B, além dos atritos com o PTB e os sindicatos). Mesmo parte da base política do governo- o PSD- demandou para as fileiras da quebra da legalidade, amplamente noticiada pela mídia como "uma revolução democrática''. O General Olímpio Mourão Filho- um ex-tenente- comandou sua coluna para São Paulo, obtendo êxito; o Marechal Castelo Branco, coordenador do golpe, acabou por ser indicado para a presidência da República, declarada vaga, mesmo estando Goulart ainda presente no país.
Marcha da família com Deus pela liberdade, em 1964
Acabar com as contradições sociais e os conflitos delas decorrentes, além de reajustar o modelo econômico juscelinista, era o verdadeiro escopo do movimento que tomou o poder em um único dia, sem disparar um único tiro, tamanha foi sua articulação com a sociedade civil e os poderes econômicos e políticos internacionais.
A coalizão golpista reunia uma imensa gama de participantes, principalmente empresários, latifundiários, undenistas, membros do clero católico, profissionais liberais e mesmo políticos aliados ao governo Jango (como Ulysses Guimarães e Tancredo Neves), que apenas almejavam a derrota de Goulart e a pacificação da convulsionada ordem social
A imagem ao lado representa o jogo político em 1964: o Exército, o IPES, o IBAD e a classe média derrubam JANGO em um certeiro "xeque-e-mate''
Os militares ocuparam as ruas, prendendo os principais opositores de suas pretensões e caçando alguns mandatos eletivos, nos primeiros dias seguintes ao golpe. Por sua vez, como a justificativa de tamanha quebra da ordem legal era apenas preservá-la (paradoxalmente...), o Congresso Nacional foi mantido em funcionamento, juntamente com os demais serviços básicos da Administração Pública. As reformas de base foram engavetadas- para sempre-, e um novo governo, comandando pelo Marechal Castelo Branco, assumiu o poder. Militares, empresários e técnicos- estes viriam a dominar o governo em certa fase da ditadura- assumiram os principais postos políticos e desfechou-se uma verdadeira faxina, com o escopo maior de reorganizar o pais (em suma, esmagando as pretensões populares à uma maior participação no poder e na riqueza nacional) inviabilizando as contradições internas do desenvolvimentismo e promovendo um forte ajuste fiscal. Tratou-se de organizar a casa com o fim implícito de garantir os investimentos das multinacionais estrangeiras no país, embora tais fatores, como infelizmente ainda se convenciona pelos adeptos de uma visão histórica mais à esquerda (que insiste em considerá-las únicas causas do golpe), não tenham sido os preponderantes ou únicos a contribuir para a deposição do Goulart. O cenário político, aqui defende-se, teve ainda mais peso.
Marcha da família com Deus pela liberdade, em 1964
Acabar com as contradições sociais e os conflitos delas decorrentes, além de reajustar o modelo econômico juscelinista, era o verdadeiro escopo do movimento que tomou o poder em um único dia, sem disparar um único tiro, tamanha foi sua articulação com a sociedade civil e os poderes econômicos e políticos internacionais.
A coalizão golpista reunia uma imensa gama de participantes, principalmente empresários, latifundiários, undenistas, membros do clero católico, profissionais liberais e mesmo políticos aliados ao governo Jango (como Ulysses Guimarães e Tancredo Neves), que apenas almejavam a derrota de Goulart e a pacificação da convulsionada ordem social
A imagem ao lado representa o jogo político em 1964: o Exército, o IPES, o IBAD e a classe média derrubam JANGO em um certeiro "xeque-e-mate''
Os militares ocuparam as ruas, prendendo os principais opositores de suas pretensões e caçando alguns mandatos eletivos, nos primeiros dias seguintes ao golpe. Por sua vez, como a justificativa de tamanha quebra da ordem legal era apenas preservá-la (paradoxalmente...), o Congresso Nacional foi mantido em funcionamento, juntamente com os demais serviços básicos da Administração Pública. As reformas de base foram engavetadas- para sempre-, e um novo governo, comandando pelo Marechal Castelo Branco, assumiu o poder. Militares, empresários e técnicos- estes viriam a dominar o governo em certa fase da ditadura- assumiram os principais postos políticos e desfechou-se uma verdadeira faxina, com o escopo maior de reorganizar o pais (em suma, esmagando as pretensões populares à uma maior participação no poder e na riqueza nacional) inviabilizando as contradições internas do desenvolvimentismo e promovendo um forte ajuste fiscal. Tratou-se de organizar a casa com o fim implícito de garantir os investimentos das multinacionais estrangeiras no país, embora tais fatores, como infelizmente ainda se convenciona pelos adeptos de uma visão histórica mais à esquerda (que insiste em considerá-las únicas causas do golpe), não tenham sido os preponderantes ou únicos a contribuir para a deposição do Goulart. O cenário político, aqui defende-se, teve ainda mais peso.
A ideia era devolver o poder aos civis por meio de eleições diretas, logo após o extermínio dos "subversivos'' e do ajuste econômico. Os militares fariam o trabalho sujo de prender, cassar e reprimir, além de cortar salários, aumentar os juros e cortar gastos e pessoal do serviço público. Mas, infelizmente, a instituição salvadora da Pátria levou às últimas consequências essa missão autoimposta- tanto que, quando menos se esperou, escancarou-se uma ditadura brutal, que se voltou mesmo contra aqueles que a apoiaram (dentre eles, o próprio JK, Carlos Lacerda e inúmeros outros políticos, bem como o próprio empresariado nacional, esmigalhado pela política econômica adotada pelos militares). O monstro devorou os criadores e, em decorrência o próprio Brasil, cujas feridas ocasionadas em tal período sangram até hoje.
Enfim, a luta de classes gerou uma reação das classes dominantes, e mesmo classes médias, contra qualquer medida distributiva de renda ou nacionalista, quanto ao aspecto econômico. Esse postulado liberal, contudo, foi posteriormente demolido quando os militares consolidaram o poder político em suas próprias mãos. A instituição repressora da sociedade, mas paradoxalmente o centro dos revolucionários (tenentismo) em um passado não tão distante, portadora de ideias próprias e desvinculadas do domínio do empresariado, adquiriu autonomia e passou por cima do poder econômico, sem, contudo, modificar a ordem social; despregados da coalizão civil que os elevara ao poder, os generais impõem, emulando o Estado Novo, uma reforma geral à sociedade, de cima para baixo. Tratou-se de uma reforma social segundo suas linhas ideológicas, resultado de mais de 100 anos de maturação e desenvolvimento, culminante na Doutrina de Segurança Nacional. Assim, parte da superestrutura politica (o Exército), apesar de acompanhar as pretensões dos proprietários dos meios de produção em acentuar a desigualdade social mitigada por Vargas e JK, delas se desvinculou, revoltando-se contra a infraestrutura (um verdadeiro pecado, em termos de teoria materialista da história...) e dando-lhe organização diversa, paradoxalmente adotando, posteriormente, práticas econômicas juscelinistas (e mesmo seu modelo nacional-desenvolvimentista) e mesmo medidas nacionalistas muito aparentadas à Vargas; por outro lado, herdam os mesmos mecanismos repressivos vigentes no Estado Novo e, sim, promoveram importantes reformas penais, processuais, financeiras e administrativas. Pode-se dizer que o Estado e a sociedade que surgem com o governo dos militares está, em muitos aspectos, presente na atual realidade.
Mas os próximos movimentos só serão analisados em postagens futuras. Aguardem!
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