"amolei os chifres do touro
encaixei-os de cada lado da cabeça
montei todas essas peças
para gargalhar deste conto impuro
pois enquanto os chifres cresciam
eu cavalgava com a égua lá
portanto os cofres se enchiam
de segredos e pérolas do mar
cai no chão, quebrado
juntei os cacos, decepcionado.
quando o cavaleiro vira touro
e de suas têmporas brotam galhas
por que as éguas são tão falhas?
tudo o que vai, volta
o cavaleiro do passado é de hoje o animal
fecha os olhos, dizem, se põe a tentar
tenta imaginar que ainda podes montar...''
segunda-feira, 17 de abril de 2017
terça-feira, 4 de abril de 2017
Uma cidade sem contraditório: Garanhuns, terra da unânimidade
Cidades pequenas e médias do Nordeste geralmente são marcadas por fortes disputas entre o grupo do poder e a oposição. Quem já viu sabe que a troca de farpas e disputas eleitorais são como finais de campeonato, de modo que a inexistência de oposição em um município é quase como uma maratona onde só há um corredor; além de tedioso, destrói o "espírito da coisa''. Em relação a Garanhuns, aproveitando o gancho metafísico, a oposição ao atual governo é quase etérea, fantasmagórica. Crer nela é como crer em algo sobrenatural, presumido; difícil de levar a sério. Mas uma coisa precisa ser confirmada: a fraqueza da oposição não decorre do brilhantismo nem das realizações do atual governo.
É pura desarticulação e falta de estratégia, por que existe margem e base eleitoral de no mínimo 1/3 da população. Aliás, é até de se esperar que depois de uma campanha e uma derrota eleitoral da envergadura da que houve esse encolhimento/desorganização ocorra.
Quanto ao governo em si, não há dúvida de que possui aspectos positivos. Foi admirável ter mantido a saúde financeira do município em meio a essa crise e ainda conseguir fazer investimentos de relevo. Mas o problema essencial é de conceito: se a estratégia de desenvolvimento da cidade é o saneamento urbano (e a marca de 400 ruas é de dar os parabéns) massificado, não podemos nunca pensar em sair do atual estágio sócio-econômico. A verdade é que Garanhuns é uma cidade pólo em decadência, sem visão de futuro nem uso racional e planejado de suas potencialidades. Tudo isso se confirma pela queda contínua na participação da cidade na geração de riqueza do Estado, que vai sendo ultrapassada por municípios menores. É uma cidade linda e com belos eventos, perfeita para aposentados e funcionários públicos, mas onde ninguém pensa em se estabelecer fora dessas duas hipóteses. Nem preciso mencionar o quadro de terra arrasada da zona rural. Ou a desorganização dos postos de saúde, cuja ausência de serviços e medicamentos básicos superlotam o Hospital Dom Moura - o que torna, sim, a má qualidade da saúde pública no município responsabilidade do governo municipal.
Por fim, uma cidade sem oposição minimamente articulada acaba sendo um cenário perfeito para a "lei de bronze das oligarquias''. Funciona assim: grandes grupos políticos, como o que domina Garanhuns hoje, precisam de uma estrutura centralizada de comando que possa intermediar e coordenar os interesses em disputa. Esse comando centralizado tende a promover os que lhe são fiéis e sancionar os que não são. Logo, qualquer político passa a depender das relações viscerais com esse comando e o fim dos dois passa a ser a auto-perpetuação. Disso aí para o patrimonialismo, populismo fiscal, clientelismo e até mesmo controle da informação é um pulo. O agravante da situação de Garanhuns é a aliança dos grupos políticos dominantes com políticos de expressão nacional que não são oriundos da cidade - que passa a ser um mero curral eleitoral onde se aventuram, vez ou outra, candidatos proporcionais (Paulo Camelo, ex-candidato a prefeito, chama de "legião estrangeira'' a esses grupos, o que, apesar do aparente exagero, tem um grande fundo de verdade). E assim as verbas federais raramente aparecem...
Toda a situação de abandono e marasmo só tende a piorar quando não existem, ou não se fazem ouvir alto o bastante, vozes dissonantes do discurso oficial. É óbvio que em um município que só faz decrescer e encolher politicamente existe muita coisa errada, coloquialmente falando - e a fraqueza das vozes contrárias só contribui para, no fim das contas, o preço pela omissão seja amargamente pago por todos.
E assim vamos a passos largos para mais uma década submergindo na corrida do desenvolvimento. Oposição e situação são igualmente responsáveis por essa lamentável tendência. Em terra de unanimidade, a cegueira é uma fatalidade: só se sente o abismo quando se está caindo nele.
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